PARASITOSES INTESTINAIS
As parasitoses intestinais ou enteroparasitoses são doenças de alta prevalência, principalmente em países menos desenvolvidos e em desenvolvimento, ou regiões de pobreza em que há significativas limitações de acesso a medidas de saneamento básico, presença de hábitos sanitários inadequados ou controle insuficiente ou ausente da população de vetores. São causadas por helmintos ou protozoários transmitidos ao ser humano, principalmente por via fecal-oral (através de água ou alimentos principalmente) ou penetração na pele (contato com solo ou água contaminados). Crianças parasitadas apresentam variados sinais e sintomas, mas destaca-se o significativo impacto negativo sobre seu estado nutricional, crescimento e desenvolvimento cognitivo.
Etiologia
Os principais agentes etiológicos das enteroparasitoses, são:
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Nematelmintos: Ascaris lumbricoides; Ancilostoma duodenale; Necator americanus; Strongyloides stercoralis; Enterobius vermiculares; Trichuris trichiura, Wulchereria bancrofti, Toxocara canis, Trichinella spiralis
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Platelmintos: Schistossoma mansoni, Taenia saginata; Taenia solium; Hymenolepis nana; Diphylobothrium latum, Echinococcus granulosus
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Protozoários: Entamoeba histolytica; Balantidium coli; Giardia lamblia; Isospora belli; Cryptosporidium sp.; Blastocystis hominis; Cyclospora cayetanensis
Quadro Clínico
A sintomatologia relacionada às parasitoses intestinais se divide em sintomas comuns à maioria das enteroparasitoses e sinais e sintomas característicos de determinados parasitas em particular.
Sinais e sintomas comuns à maioria das enteroparasitoses:
Dor abdominal, diarreia, náuseas, vômitos, alterações do apetite, anemia, perda ponderal, eosinofilia periférica
Sinais e sintomas característicos de determinados parasitas:
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Semi-oclusão ou oclusão intestinal: Ascaris lumbricoides
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Anemia ferropriva: Ancylostoma duodenale, Necator americanus e Trichuris trichiura
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Hiperinfestação em imunodeficientes e risco de sepse por enterobactérias: Strongyloides stercoralis
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Síndrome de Löeffler: Strongyloides stercoralis, A. duodenale/Necator americanus e A. lumbricoides (parasitas com ciclo pulmonar)
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Comprometimento hepático, intestinal,esplênico e varizes esofágicas: Schistossoma mansoni
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Síndrome desabsortiva, perda ponderal, déficit de vitaminas A, D, E, K, vitamina B12, ferro e lactase: Giardia lamblia, Strongyloides stercoralis.
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Disenteria, invasão da mucosa intestinal atingindo sítios extra intestinais por via hematogênica: Entamoeba histolitica
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Crises epilépticas, hipertensão intracraniana, meningite, distúrbios neurológicos: Taenia solium (neurocisticercose)
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Edema linfático, elefantíase: larvas da Wulchereria bancrofti (filariose)
Diagnóstico
O diagnóstico clínico se baseia na presença de sinais e sintomas, no entanto, devido à semelhança de sintomas da maioria das parasitoses, a confirmação se dá pela visualização dos enteroparasitas, cistos, ovos ou formas larvárias nas fezes ou ainda pela positividade de algum outro método diagnóstico indireto. O exame parasitológico de fezes (EPF) é o método mais frequente, porém com baixa sensibilidade (positividade em uma amostra fecal: cerca de 50%; em três amostras: 60% a 90%). A sensibilidade do EPF varia de acordo com a qualidade da amostra, o tempo decorrido desde a coleta até a realização do exame e depende também da adequação do método diagnóstico utilizado.
Exames laboratoriais
Exame parasitológico de fezes e suas especificidades técnicas:
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Para a visualização de ovos e larvas de helmintos, cistos de protozoários: Método de Hoffman-Pons-Janer e Método Lutz (Sedimentação espontânea) ou Método do MIF-c (Sedimentação por centrifugação)
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Para a visualização de ovos leves (Ancilostomídeos): Método de Willis (Flutuação espontânea)
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Para a visualização de cistos e oocistos de protozoários e ovos leves (Ancilostomídeos): Método de Faust (Flutuação e centrifugação)
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Para a visualização de larvas (Strongyloides): Método de Baerman-Morais e Rugai
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Para a visualização de ovos de helmintos: Método de Kato-Katz
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Para a visualização de Enterobius vermiculares: Método da fita adesiva.
Tratamento farmacológico
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Ascaridíase, ancilostomíase e necatoríase: Albendazol 400 mg em dose única, ou Mebendazol 100 mg 2 vezes ao dia por 3 dias. O mebendazol precisa ser repetido em duas a três semanas, pois não é larvicida e não atinge as larvas no ciclo cardiopulmonar.
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Tricuríase: Albendazol 400 mg/dia por 5 dias, associado com Ivermectina 0,2 mg/kg/dia por 3 dias.
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Estrongiloidíase: Ivermectina 0,2 mg/kg/dia por 3 dias ou Albendazol 400 mg duas vezes ao dia por 7 dias ou Tiabendazol 25mg/kg/dose, 2 vezes ao dia durante 3 dias.
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Enterobíase (Oxiuríase): Albendazol 400 mg em dose única (Repetir em 2 semanas) ou Pamoato de pirvínio 10 mg/kg em dose única. (Repetir em 2 semanas)
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Toxocaríase: Albendazol 400 mg, 2 vezes ao dia, 5 dias
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Triquinose: Albendazol 400 mg 2 vezes ao dia, 10-14 dias
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Teníase: Praziquantel 5-10 mg/Kg em dose única ou Albendazol 400 mg/dia por 3 dias
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Cisticercose: Praziquantel 50mg/kg/dia,1 vez ao dia, por15 dias ou Albendazol 400 mg 2 vezes ao dia durante 2-4 semanas
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Himenolopíase: Praziquantel 25 mg/Kg em dose única
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Schistossomose: Praziquantel 40 a 60 mg/Kg em dose única
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Giardíase: Metronidazol 15 mg/kg/dia, 8/8h ou 12/12h, por 7 dias ou Albendazol 400mg/dia, 5 dias ou Nitazoxanida 7,5mg/kg /dose, 2 vezes ao dia, durante 3 dias (acima de 12 anos de idade 500 mg 2 vezes ao dia por 3 dias)
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Amebíase: Metronidazol 30 mg/kg/dia, 8/8h ou 12/12h, por 10 dias ou Secnidazol 30 mg/kg dose única
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Balantidiose: Metronidazol 30 mg/kg/dia, 8/8h ou 12/12h, por 5 dias
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Blastocistose: Metronidazol 15 mg/kg/dia, 8/8h ou 12/12h, por 7 dias ou Nitazoxanida 7,5mg/kg /dose, 2 vezes ao dia, durante 3 dias (acima de 12 anos de idade 500 mg 2 vezes ao dia por 3 dias)
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Criptosporidiose: Nitazoxanida 7,5mg/kg /dose, 2 vezes ao dia, durante 3 dias (acima de 12 anos de idade 500 mg 2 vezes ao dia por 3 dias)
Albendazol
Apresentação: suspensão 400 mg/10 ml (Frasco com 10 mL); comprimidos 400 mg (caixa com 1 comprimido)
Dose máxima: 800 mg/dia
Idade mínima: 2 anos
Ivermectina
Apresentação: comprimidos 6 mg (caixa com 2 ou 4 comprimidos)
Dose máxima: 12 mg/dia
Idade mínima: 3 anos ou peso de 15 kg
Mebendazol
Apresentação: 100 mg/5 ml suspensão (Frasco com 30 mL); 100 mg comprimidos (caixa com 6 comprimidos)
Dose máxima: 400 mg/dia
Idade mínima: 1 ano
Benzoil-metronidazol
Apresentação: 200 mg/5 ml suspensão (Frascos com 80, 100 ou 120 ml)
Dose máxima: 2g/dia
Idade mínima: não há restrição de faixa etária
Metronidazol
Apresentação: comprimidos 250 mg ou 400 mg (caixa com 20 ou 24 comprimidos)
Dose máxima: 2g/dia
Idade mínima: não há restrição de faixa etária
Nitazoxanida
Apresentação: suspensão 20 mg/ml (Frasco com 45 mL ou 100 mL); comprimidos 500 mg (caixa com 6 comprimidos)
Dose máxima: 600 mg/dia (em menores de 12 anos)
Idade mínima: 1 ano
Pamoato de Pirvínio
Apresentação: suspensão 10 mg/mL (Frasco com 40 mL); drágea 100 mg (caixa com 6 drágeas)
Dose máxima: 600 mg/dia
Idade mínima: 1 ano
Praziquantel
Apresentação: comprimidos 600 mg
Dose máxima: 600 mg/dia
Idade mínima: 4 anos
Secnidazol
Apresentação: comprimidos 1.000 mg (caixa com 2 ou 4 comprimidos)
Dose máxima: 2g/dia
Idade mínima: não há restrição de faixa etária
Tiabendazol
Apresentação: suspensão 250 mg/5ml (Frasco com 40 mL); comprimidos 500 mg (caixa com 6 comprimidos)
Dose máxima: 3g/dia
Idade mínima: 3 anos
Profilaxia
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Tratamento adequado do(s) doentes
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Cuidados de higiene pessoal (banho diário, lavagem das mãos, principalmente antes de se alimentar, higiene bucal, corte frequente das unhas etc.)
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Medidas de higiene ambiental (combate a moscas e insetos vetores, limpeza do ambiente, destino adequado do lixo, uso de instalações sanitárias etc.)
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Higiene da água e alimentos, principalmente os alimentos ingeridos crus. Não ingerir carnes cruas ou malpassadas. Cuidados com a água a ser ingerida devendo ser filtrada ou fervida ou utilização de hipoclorito de sódio.
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Uso de calçados
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Não entrar em rios e lagoas principalmente em regiões endêmicas para esquistossomose
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Adotar medidas de saneamento e higiene para a população em geral, principalmente em creches e escolas
Ascaridíase (Ascaris lumbricoides)
Epidemiologia
É o helminto mais prevalente no mundo e o que apresenta maior incidência de complicações.
Ciclo biológico
Os ovos são eliminados com as fezes e contaminam o solo. A transmissão se dá pela ingestão do ovo, pela contaminação das mãos, geofagia, contaminação de água e alimentos. O ovo eclode no intestino delgado, libera a larva, que no ceco atravessa a mucosa e por via linfática ou venosa passa pelo fígado, atinge o átrio direito, artérias pulmonares e se aloja nos alvéolos. Sofre evoluções larvárias, ascende pelas vias aéreas até a faringe, é deglutida e vai se alojar no lúmen do intestino delgado onde irá se tornar adulto e a fêmea inicia a postura de ovos.
Patogenia e manifestações clínicas
Pelas larvas:
- Migração de larvas: No parênquima hepático podem produzir com necrose focal e fibrose (semelhante ao quadro de toxocaríase). A passagem das larvas pelos pulmões leva à Síndrome de Löeffler: pneumonite larvária, com febre, tosse, expectoração, dispneia, eosinofilia periférica moderada ou intensa.
Pelos vermes adultos:
- Ação espoliadora – consumo de grande parte dos macronutrientes e micronutrientes ingeridos pela criança, desnutrição proteico-energética, baixa estatura, desenvolvimento comprometido;
- Sub-oclusão ou obstrução intestinal – O enovelamento de grande número de parasitas obstrui o lúmen do intestino delgado. O paciente apresenta cólicas, distensão abdominal, vômitos biliosos, desidratação e às vezes diarreia no início do quadro. É comum a criança eliminar as lombrigas pela boca, narinas ou ânus, antes ou durante a vigência do quadro. Pode ocorrer isquemia de alça, necrose, perfuração ou volvo do intestino.
- Migração do Áscaris (verme adulto) – O Ascaris tem como característica um grande poder de migração e invasão ocasionando quadros graves, tais como: (1) apendicite, por invasão do apêndice cecal; (2) pancreatite, por obstrução da ampola de Vater e ducto de Wirsung; (3) colestase e colangite, por obstrução da ampola de Vater e árvore biliar; (4) abcesso hepático, pela subida dos vermes até o interior do parênquima do fígado; (5) asfixia, por obstrução de vias aéreas ou cânula traqueal.
Ancilostomíase (Necator americanus; Ancylostoma duodenale)
Epidemiologia
As duas espécies coexistem em alguns locais do Brasil e América Latina. Infectam mais de 400 milhões de pessoas no mundo.
Ciclo biológico
Os ovos eliminados com as fezes contaminam o solo e liberam as larvas que evoluem em 5 estágios. A larva filarioide L3 é a forma infectante que penetra na pele do hospedeiro e por via linfática ou venosa é transportada até os pulmões. Na evolução as larvas sobem dos alvéolos, pela árvore respiratória, até a faringe ,onde é deglutida. No intestino delgado originam os vermes adultos que se fixam à mlucosa pela cápsula bucal, onde as fêmeas iniciam a postura de ovos. Pode haver infestação direta, sem ciclo pulmonar, se houver ingestão da larva L3.
Patogenia e manifestações clínicas
Cada verme adulto ocasiona perda diária de 0,01 a 0,4ml de sangue por dia. A perda de sangue ocorre porque o verme suga o sangue da mucosa e muda de lugar 4 ou 5 vezes por dia causando lesão hemorrágia na mucosa em cada ponto em que se fixa. A sintomatologia irá depender do número de vermes, da espécie de ancilostomídeo, ou das condições do hospedeiro. São possíveis os seguintes sintomas: (1) Dermatite Larvária no local da penetração cutânea das larvas. Ocasiona prurido, eritema, edema, erupção papulovesicular com duração de até duas semanas. (2) Pneumonite Larvária: menos intensa do que na infecção por áscaris; (3) Parasitismo Intestinal: na fase aguda pode ocorrer dor epigástrica, náuseas, vômitos, alterações no apetite, flatulência, diarreia. (4) Anemia hipocrômica e microcítica ocasionando palidez, hiporexia, astenia, adinamia, perda ponderal, palpitações, sopro cardíaco, entre outros.
Estrongiloidíase (Strongyloides stercoralis)
Epidemiologia
É responsável por mais de 50 milhões de infectados no mundo, sendo causa de doença grave em indivíduos imunossuprimidos.
Ciclo biológico
Envolve uma fase no intestino delgado do hospedeiro, protagonizada por fêmeas, e uma fase no solo, onde machos e fêmeas têm vida livre, no solo. As larvas originárias dos ovos provenientes das fêmeas existentes no intestino humano ou das fêmeas de vida livre no solo evoluem rapidamente para a forma infectante filarioide. Existe mais de uma forma de transmissão. Na primo-infecção, as larvas presentes no solo penetram o hospedeiro através da pele e depois migram para o ciclo pulmonar de modo semelhante aos ancilostomídeos. Na autoinfecção, os ovos provenientes das fêmeas habitantes do intestino eclodem, rapidamente as larvas evoluem até a forma infectante e, antes de serem excretadas com as fezes, penetram a mucosa no íleo, nos cólons (de modo semelhante ao Ascaris) ou penetram a pele na região perianal. Por via linfática ou venosa atingem o coração direito, para em seguida fazer o ciclo pulmonar. As larvas ascendem pelas vias respiratórias e faringe, sendo deglutidas. Tornam-se fêmeas adultas no duodeno e jejuno, onde se alojam no interior das criptas da mucosa e tem início a oviposição.
Patogenia e manifestações clínicas
Dermatite larvária pode ocorrer nos pés, mãos, nádegas ou região anogenital. Pneumonite larvária, com dispneia, tosse, febre e eosinofilia (Síndrome de Löeffler). O parasitismo no intestino delgado determina anorexia, náuseas, vômitos, dor em abdome superior, distensão abdominal, entre outros. Eventualmente, em casos de elevada carga parasitária, pode haver síndrome de má absorção exuberante. Nos pacientes imunodeprimidos, os parasitas infectam todo o intestino e a autoinfecção interna ocorre maciçamente. As larvas filarioides migram para o fígado, pulmões e inúmeros outros órgãos. Pode ocorrer bacteremia e sepse bateriana, pois os vermes transportam consigo as enterobactérias intestinais. Esse quadro de estrongiloidíase disseminada é grave e de alta mortalidade.
Trichiuríase (Trichiuris trichiura)
Epidemiologia
É responsável por cerca de 700 milhões de portadores no mundo, na grande maioria crianças, especialmente pré-escolares.
Ciclo biológico
A contaminação é fecal-oral. Os ovos são eliminados com as fezes e contaminam o ambiente, água e alimentos. O homem ingere os ovos, que sofrem ação de sucos digestivos e libertam as larvas. Estas sofrem várias mudas até tornarem-se vermes
adultos que se instalam no intestino grosso, especialmente o ceco, onde iniciam a oviposição.
Patogenia e manifestações clínicas
O verme adulto introduz a extremidade anterior na mucosa intestinal para se fixar. Diariamente muda de lugar e assim provoca erosões e ulcerações múltiplas. A intensidade do quadro clínico varia de acordo com a carga parasitária e o hospedeiro. Em crianças subnutridas que vivem em ambientes sem saneamento básico, pode se instalar a trichiuríase maciça. Em quase todos os casos ocorre distensão abdominal e cólicas, vômitos, disenteria crônica com fezes mucossanguinolentas, tenesmo, anemia hipocrômica e microcítica e desnutrição. Pode ocorrer prolapso retal em alguns pacientes. Outra complicação possível é a apendicite aguda.
Oxiuríase ou Enterobíase (Enterobius vermiculares)
Epidemiologia
Essa parasitose ocorre no mundo todo e nos países desenvolvidos é a helmintíase de maior prevalência.
Ciclo biológico
A transmissão é fecal-oral. Os ovos ingeridos liberam as larvas no intestino e estas se fixam no ceco onde evoluem até a forma adulta. A fêmea fecundada não libera os ovos até que seu útero esteja repleto. Então ela migra para a região anal, onde faz a postura. Sua presença nesta região causa intenso prurido, o que favorece a transmissão do ânus para a boca, principalmente por crianças. A transmissão também é possível, com a inalação e ingesta de ovos presentes no meio ambiente.
Patogenia e manifestações clínicas
O parasita pode provocar inflamação superficial na mucosa do intestino grosso e alguns sintomas, como dor abdominal em cólica e tenesmo. Mas o sintoma predominante é o intenso prurido anal, pior à noite, pela presença das fêmeas no local, onde também pode se observar processo inflamatório no ânus e região perianal. A criança pode apresentar irritabilidade intensa e insônia, devido ao prurido. Nas meninas o parasita pode migrar para a vulva, uretra e vagina causando vulvovaginite, caracterizada por prurido vulvar, inflamação vulvovaginal, corrimento e, eventualmente, até anexite.
Teníase (Taenia solium; Taenia saginata)
Epidemiologia
O homem é o hospedeiro definitivo. Os hospedeiros intermediários são o porco (T. solium) ou o boi (T. saginata). Na fase adulta, as tênias habitam o intestino delgado do homem. A maior prevalência ocorre em pessoas jovens de regiões rurais. Os hábitos culturais de consumo de carnes cruas ou malcozidas, aliados ao destino inadequado das fezes humanas, favorecem sua disseminação. A OMS estimou a existência de 70 milhões de pessoas contaminadas, com cerca de 50 mil mortes anuais.
Ciclo biológico
As tênias são parasitas longos (medem vários metros de comprimento), sendo a T. saginata mais longa que a T. solium. O escólex ("cabeça") possui ventosas que fixam o verme à mucosa do duodeno ou jejuno. Os proglotes (anéis que formam o corpo do verme) se tornam maduros e podem conter milhares de ovos que são eliminados pelas fezes. Os ovos contaminam o meio ambiente e após serem ingeridos pelos animais (hospedeiros intermediários), eclodem no seu intestino delgado liberando embriões (oncosferas). As oncosferas, penetram na parede intestinal e circulam até o tecido muscular do animal onde evoluem para cisticercos (cistos contendo forma larvária da Taenia). A carne do animal, contaminada com cisticercos, ao ser ingerida pelo homem, crua ou mal cozida, determina a contaminação. Os sucos digestivos fazem o cisticerco liberar o escólex, que irá se fixar à mucosa do intestino delgado do homem e iniciar seu desenvolvimento. Após alguns meses, tem início a eliminação das proglotes maduras com os ovos.
Patogenia e manifestações clínicas
A teníase é muitas vezes assintomática. Porém, pode apresentar sintomas como por exemplo, fadiga, tontura, alterações do apetite, náuseas, vômitos, dor abdominal, perda de peso, diarreia e/ou constipação, urticária, eosinofilia. Há inflamação no local de fixação do verme, no duodeno ou jejuno. Essas manifestações são quase que exclusivas da teníase causada por T. saginata. O grande problema da T. solium é quando o homem se torna o hospedeiro intermediário. Isto ocorre quando o homem ingere ovos da T. solium. Nesse caso, o ciclo que ocorre no porco, irá ocorrer no homem. Os ovos eclodem no seu intestino delgado liberando oncosferas que penetram na parede intestinal e circulam até o tecido muscular, sistema nervoso, olho, onde evoluem para cisticercos. Nesse caso, o homem passa a ser portador de cisticercose e não de teníase. A maioria dos casos morte dessa parasitose, acontece pelas complicações da neurocisticercose (instalação de cisticercos no sistema nervoso central).
Amebíase (Entamoeba histolitica)
Epidemiologia
Há duas espécies morfologicamente idênticas de protozoários:
(1) Entamoeba histolytica, patogênica e invasiva, capaz de causar diversas síndromes clínicas graves.
(2) Entamoeba dispar, protozoário de baixa virulência e não invasivo, responsável por 90% dos casos de amebíase no mundo, especialmente as formas assintomáticas e a colite não disentérica.
Ciclo biológico
A contaminação se dá pela ingestão de cistos maduros presentes em alimentos ou água contaminada. Os cistos se multiplicam até se transformar em trofozoítos. O desencistamento ocorre pouco antes de alcançar o intestino grosso. Por terem metabolismo anaeróbico são adaptados para viver nos cólons, onde se alimentam de detritos e bactérias. Em condições adversas, sofrem encistamento novamente e são eliminados com as fezes, contaminando o meio ambiente.
Patogenia e manifestações clínicas
Quando o equilíbrio parasita-hospedeiro é rompido, os trofozoítos invadem a mucosa dos cólons e formam úlceras resultando processo inflamatório ulcerativo nos cólons (colite amebiana). Pela circulação porta podem invadir outros órgãos, como fígado, pulmão e cérebro, entre outros. Nos tecidos invadidos os trofozoítos são hematófagos e podem causar a formação de abscessos (abscessos amebianos). A amebíase é assintomática na grande maioria dos portadores. Os sintomas dependem de sua localização, no intestino (amebíase intestinal) ou em órgãos situados fora do intestino (amebíase extra-intestinal).
Amebíase intestinal
No intestino grosso, o parasita causa colite ulcerativa (inflamação e úlceras na mucosa colônica) em graus variados de gravidade (colite não disentérica, colite disentérica, colite necrosante). Os sintomas incluem dor abdominal em cólica, flatulência, períodos de diarreia com fezes líquidas ou semi-líquidas, disenteria com mais de dez evacuações mucossanguinolentas por dia, tenesmo, febre moderada, distensão abdominal. Podem ocorrer distúrbios hidroeletrolíticos e desnutrição proteico-energética. Nos casos de colite necrosante, a invasão do protozoário se estende para camadas mais profundas da parede do cólon, ocasionando isquemia, hemorragia, megacólon tóxico e às vezes perfuração. Há febre alta, fácies toxêmica, sinais de choque, peritonite e distúrbios metabólicos. A mortalidade do quadro necrosante é elevada. Outra manifestação intestinal que pode ocorrer é a formação de granulomas na mucosa colônica ou anorretal (ameboma) causando edema e estreitamento do lúmen e manifestações de diarréia ou constipação intestinal de forma alternada.
Amebíase extra-intestinal
O quadro de amebíase extra-intestinal é menos comum em crianças. Os trofozoítos de E. histolytica podem migrar através da veia mesentérica superior e chegar ao fígado, provocando processo inflamatório difuso com necrose no parênquima hepático (abscesso hepático amebiano). O paciente apresenta febre alta, dor intensa no hipocôndrio direito com irradiações típicas de cólica biliar e hepatomegalia muito dolorosa à palpação. Em geral não há icterícia. Esta doença grave pode complicar com infecção bacteriana secundária, ruptura para a cavidade abdominal, com elevada mortalidade, ruptura para o pulmão e pleura ou pericárdio. A disseminação hematogênica do trofozoíto pode causar a formação de abscessos no pulmão, pericárdio, pele, aparelho gênito-urinário e cérebro.
Giardíase (Giardia lamblia)
Epidemiologia
Parece ser o parasita intestinal mais prevalente no mundo. Água não potável é uma das maiores fontes de transmissão. Dissemina-se facilmente entre crianças institucionalizadas, creches ou escola. Estima-se em 200 milhões os portadores de giardíase sintomática em todo o mundo.
Ciclo biológico
A localização preferida é o duodeno e jejuno. Os cistos presentes no meio externo são ingeridos pela água ou alimentos contaminados. Transformam-se em trofozoítos no duodeno, onde se multiplicam rapidamente e se fixam à mucosa pelos discos suctoriais. Os trofozoítos podem assumir a forma de cistos, que são eliminados com as fezes e podem contaminar o meio ambiente.
Patogenia e manifestações clínicas
A presença do protozoário na mucosa intestinal, pode interferir na absorção de nutrientes por vários mecanismos, incluindo a atrofia vilositária, infiltrado inflamatório e hipertrofia de criptas, lesão do enterócito, invasão da mucosa, sobrecrescimento bacteriano no intestino delgado, desconjugação de ácidos biliares, diminuição da atividade das dissacaridases. Como consequência destes mecanismos a criança desenvolve má absorção de carboidratos, lipideos, vitaminas A, D, E, K, B12, ácido fólico e ferro, entre outros nutrientes.