EXAME NEUROLÓGICO
Semiologia do Sistema Nervoso
O exame neurológico permite avaliar a integridade do sistema nervoso da criança e estabelecer o diagnóstico de variadas condições patológicas. Além disso, o exame neurológico da criança permite avaliar o neurodesenvolvimento e assim, detectar precocemente possíveis distúrbios, garantindo tratamento oportuno e adequado, maximizando as chances de recuperação e minimizando os impactos ao longo da vida.
O roteiro do exame neurológico apresentado a seguir inclui a aferição da circunferência craniana, a inspeção da pele em busca de estigmas neurocutâneos, avaliação do nível de consciência e reflexo pupilar, o exame do tônus e da força muscular, reflexos osteotendíneos, avaliação do equilíbrio, da coordenação motora e verificação da integridade dos pares de nervos cranianos. No recém-nascido e lactentes são relacionados os reflexos primitivos e posturais. A avaliação neurossensorial e a avaliação cognitiva complementam o exame neurológico e são procedimentos multidisciplinares que envolvem psicólogos, fonoaudiólogos, oftalmologistas, otorrinolaringologistas, entre outros. Apresentamos, no final, um resumo dos principais componentes do desenvolvimento cognitivo. Encerramos o roteiro incluindo os sinais de irritação meníngea e alguns aspectos da criança com paralisia cerebral.
Exame Neurológico
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Perímetro cefálico e forma do crânio
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Estigmas neurocutâneos
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Nível de consciência
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Reflexo pupilar
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Tônus e força muscular
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Reflexos osteotendíneos
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Equilíbrio
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Coordenação motora
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Nervos cranianos
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Sinais de irritação meníngea
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Sensibilidade
No recém-nascido avaliar os reflexos primitivos e posturais
Perímetro cefálico
Medir o perímetro cefálico (PC) ou circunferência craniana da criança é um procedimento simples, mas de grande importância como parte do exame neurológico, pois é capaz de fornecer informações valiosas sobre o crescimento cerebral, permitindo a detecção precoce e o acompanhamento de problemas neurológicos e a avaliação do neurodesenvolvimento. A medida do PC é realizada com uma fita métrica flexível, passada ao redor da cabeça da criança, pela proeminência frontal e pela protuberância occipital. O valor do PC em centímetros é comparado com curvas de referência específicas para sexo e idade da criança, permitindo a identificação de valores abaixo ou acima da normalidade. Os limites normais nos gráficos da OMS são os percentis 3º e 97º (ou desvio padrão -2 a +2).
A microcefalia é caracterizada por um PC menor que o percentil 3° ou menor que o desvio padrão -2, para a idade e sexo da criança. Pode ter causas genéticas, infecciosas (Zika vírus, citomegalovírus, toxoplasmose, rubéola, sífilis, meningite, encefalite, entre outras), restrição de crescimento intrauterino (CIUR), encefalopatia hipóxico-isquemica neonatal, craniossinostose etc.
A macrocefalia, caracterizada por um PC maior que o percentil 97° ou maior que o desvio padrão +2 , para a idade e sexo da criança. Pode ser causada por hidrocefalia, pode ser familiar (macrocefalia familiar benigna), pode ter causas genéticas, entre outras. Cerca de 25% dos casos de macrocefalia não têm causa identificada.
Hidrocefalia (sinal do "sol poente")
microcefalia grave
microcefalia e microcefalia grave
Estigmas neurocutâneos
Considerando o fato de que tanto a pele quanto o sistema nervoso, têm origem embrionária em comum (ectoderma), algumas lesões cutâneas podem se relacionar a doenças neurológicas. Sendo assim, a presença dessas lesões indicam a necessidade de se fazer uma investigação que permita avaliar melhor essa possibilidade.
Alguns exemplos:
-manchas "café-com-leite": Seis ou mais manchas café com leite com diâmetro maior que 5 mm em crianças antes da puberdade ou maior que 15 mm em adolescentes púberes é um dos critérios diagnósticos da neurofibromatose. Ter apenas algumas manchas não afirma o diagnóstico, embora possa aumentar o risco. Manchas café com leite com bordas nítidas e bem definidas são mais comumente associadas à neurofibromatose. A presença de neurofibromas (nódulos na pele), distúrbios neurossensoriais (visão ou audição), deformidades ósseas, histórico familiar, entre outros, aumenta a probabilidade de um diagnóstico positivo.
Shagreen (nome dado a um tipo de lesão cutânea com aspecto de couro cru enrugado ou áspero), manchas hipocrômicas, angiofibroma e fibroma periungeal indicam esclerose tuberosa. A síndrome de Sturge-Weber (hemangioma facial de coloração "vinho do porto", em região de distribuição do nervo trigêmeo (frontal, palpebral e couro cabeludo e hemiface), está associada com alterações no neurodesenvolvimento, hemangioma de leptomeninge, glaucoma e crises convulsivas. Outros exemplos incluem a melanose neurocutânea (melanose cutânea com pelos e melanose de leptomeninge), hipomelanose de Ito (manchas hipocrômicas dispersas, atraso no desenvolvimento motor, da fala e cognitivo, transtorno do espectro autista, nistagmo, deficiência auditiva, marcha atáxica, entre outros).
Síndrome de Sturge-Weber
Melanose neurocutânea
manchas café-com-leite
Shagreen
Nível de consciência
Na avaliação do nível de consciência, leva-se em consideração o estado de consciência (capacidade de se manter vigil, desperto, lúcido), a orientação espaço-temporal, a resposta a estímulos e a capacidade de comunicação. Levando-se em conta esses parâmetros, podemos ter os seguintes níveis de consciência:
1. Lucidez: Estado de consciência normal, total orientação espaço- temporal, resposta a estímulos adequada e comunicação clara.
2. Sonolência: Leve rebaixamento do estado de consciência, orientado no espaço-tempo, fácil despertar ao estímulo verbal ou tátil e comunicação lenta.
3. Letargia: Sonolência profunda e persistente, orientação espaço-temporal um pouco prejudicada, resposta a estímulos verbais e táteis com lentidão e esforço, comunicação lenta e incompleta.
4. Obnubilação: Redução do estado de consciência mais significativa, desorientação espaço-temporal, dificuldade de despertar ao estímulo verbal, mas resposta preservada ao estímulo doloroso e comunicação confusa e incompleta.
5. Torpor: Inconsciência, ausência de resposta a estímulos verbais e resposta apenas a estímulos dolorosos um pouco mais fortes.
6. Estupor: Inconsciência profunda e resposta somente a estímulos dolorosos intensos.
7. Coma: Inconsciência profunda e ausência de resposta a qualquer estímulo externo.
A Escala de Coma de Glasgow (ECG) é uma ferramenta clínica muito utilizada para avaliar o nível de consciência. A pontuação varia de 3 a 15 pontos e leva em consideração a abertura ocular, a melhor resposta verbal e a melhor resposta motora do paciente:
Abertura Ocular (AO)
4 pontos: Espontânea (abre os olhos sem estímulo).
3 pontos: Ao comando verbal (abre os olhos quando chamado).
2 pontos: Ao estímulo doloroso (abre os olhos quando pressionado).
1 ponto: Ausente (não abre os olhos a nenhum estímulo).
Resposta Verbal (RV)
5 pontos: Orientada (responde perguntas sobre nome, local e data).
4 pontos: Confusa (responde perguntas de forma incompleta ou confusa).
3 pontos: Palavras inapropriadas (emite palavras sem sentido).
2 pontos: Sons incompreensíveis (emite sons como gemidos ou grunhidos).
1 ponto: Ausente (não emite sons ou palavras).
Resposta Motora (RM)
6 pontos: Obedece comandos (segue instruções simples).
5 pontos: Localiza a dor (movimenta a mão para o local da dor).
4 pontos: Retirada anormal à dor (movimenta a mão de forma anormal em resposta à dor).
3 pontos: Flexão anormal à dor (movimenta o braço em flexão em resposta à dor).
2 pontos: Extensão à dor (movimenta o braço em extensão em resposta à dor).
1 ponto: Ausente (não responde à dor).
Interpretação da pontuação total:
13-15 pontos: Lesão leve (nível de consciência normal [15] ou levemente rebaixado [13-14]).
9-12 pontos: Lesão moderada (rebaixamento moderado do nível de consciência).
3-8 pontos: Lesão grave (rebaixamento grave do nível de consciência).
3 pontos: Estado de coma profundo ou morte cerebral.
Atenção! De acordo com a Escala de Coma de Glasgow Extendida para a Reatividade Pupilar (ECG-P) proposta em 2018, deve ser incluída a avaliação da reatividade pupilar como um componente adicional da escala. A pontuação obtida com a ECG deverá ser modificada de acordo com o disposto abaixo:
-Ausência de reatividade pupilar bilateral: subtrair dois pontos (- 2);
-Ausência de reatividade pupilar unilateral: subtrair um ponto (- 1);
-Reatividade pupilar normal: manter a pontuação da ECG inalterada ( 0 ).
Além da reatividade pupilar à luz (fotorreativas ou fixas), avaliar o diâmetro pupilar nos dois olhos (pupilas isocóricas ou anisocóricas, mióticas ou midriáticas).
Motricidade
O exame da motricidade inclui a avaliação de:
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Tônus muscular
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Força muscular
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Reflexos osteotendíneos
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Equilíbrio
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Coordenação motora
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Integridade dos pares cranianos
No recém-nascido e lactente são avaliados os reflexos primitivos e posturais
Tônus muscular
O tônus muscular representa o estado permanente de tensão basal dos músculos em repouso. É importante para a postura, marcha, movimento e coordenação motora. Sua avaliação inclui a inspeção, palpação e movimentação passiva. Na inspeção, procura-se observar a postura do paciente em pé e sentado, a simetria dos músculos e a presença de atrofia ou hipertrofia muscular. Pela palpação avalia-se sua textura e consistência, áreas de hipertonia ou hipotonia. Após isso, avalia-se a resistência do músculo à movimentação passiva.
Força muscular
A avaliação da força muscular é um componente importante do exame neurológico e permite identificar paresias (diminuição de força muscular) que podem indicar diversas condições neurológicas. Deve-se solicitar ao paciente que realize movimentos contra uma resistência. Avaliar movimentos de flexão e extensão dos membros superiores e inferiores, abdução e adução dos membros superiores e inferiores, rotação interna e externa dos membros superiores e inferiores.
A diminuição da força muscular (fraqueza muscular ou paresia) pode ser unilateral ou bilateral, focal ou difusa. Pode ser proximal (mais próxima do tronco) ou distal (mais distante do tronco). Paresia proximal, muitas vezes associada à doença neuromuscular (por exemplo, na distrofia muscular progressiva), pode ser avaliada pela manobra de Gowers. Nessa manobra pede-se que a criança sente no chão e levante. A manobra é positiva (sinalizando fraqueza muscular proximal) quando a criança se apóia no chão ou coxas para se levantar.
A perda completa da força muscular corresponde à paralisia ou plegia e corresponde à ausência de movimento do membro afetado, podendo ser paralisia flácida (paralisia com redução do tônus muscular) ou paralisia espástica (paralisia com aumento do tônus muscular). A correlação entre a área de motricidade alterada e a raiz nervosa envolvida pode ser identificada na tabela de miótomos.
Escala de Avaliação de Força Muscular
MRC (Medical Research Council)
Reflexos osteotendíneos
Os principais reflexos osteotendíneos avaliados em um exame neurológico de rotina incluem, nos membros superiores, o reflexo bicipital, braquiorradial, tricipital e flexor dos dedos das mãos e, nos membros inferiores, o reflexo patelar e o reflexo aquileu. O teste do reflexo consiste em percutir o tendão do músculo com o martelo de reflexos e observar a contração do músculo correspondente.
Os reflexos são geralmente avaliados em uma escala de 0 a 4 (0: Ausente; 1: Hipoativo; 2: Normal; 3: Hiperativo; 4: Clônus. A hiporreflexia (reflexo diminuído) ou arreflexia (reflexo ausente) podem indicar problemas com o nervo responsável pela inervação do músculo ou com a medula espinhal (neurônio motor inferior) ou com o próprio músculo. A hiperreflexia (reflexo aumentado) pode indicar lesão do neurônio motor superior (córtex motor).
Equilíbrio
Iniciar pela observação da postura e da marcha. Atentar para a postura da criança em pé e em movimento, buscando assimetrias, desvios posturais, lordose, cifose ou escoliose. Avaliar a marcha da criança, observando a existência de desequilíbrio, instabilidade, base alargada, passos curtos ou arrastar os pés. Verificar a presença de marcha atáxica (instável e com descoordenação), marcha em tesoura (pernas se cruzando), marcha equina ("pés caídos"), marcha anserina (de "pato") etc. Solicitar à criança que fique em pé com um pé só, com os olhos abertos e fechados, observando a oscilação e a necessidade de apoio. Realizar testes de equilíbrio como, por exemplo, os testes de Romberg e de Unterberger.
-Teste de Romberg: Pedir ao paciente que fique em pé, com os pés juntos e os calcanhares unidos, com os braços ao lado do corpo. Solicitar que ele feche os olhos e observar se há oscilação, desvio ou queda. O teste deve ser realizado por 30 segundos. Manter-se ao lado por segurança, para proteger e evitar uma queda.
-Teste de Unterberger: Após explicar à criança o que ela vai fazer de maneira simples e lúdica, pedir a ela que fique em pé, com os pés juntos e os olhos fechados, mantendo os braços para frente juntos e estendidos. Solicite a ela que marche no mesmo lugar, elevando os joelhos a 45° realizando 50 passos (um por segundo). Observe se ela apresenta desvio para algum lado durante a marcha.
Coordenação motora
A avaliação da coordenação motora no exame neurológico da criança é importante para identificar possíveis distúrbios no desenvolvimento e funcionamento do sistema nervoso. Deve ser levado em consideração a idade da criança e seu estágio de desenvolvimento.
-Coordenação motora grossa: Observar a capacidade da criança em realizar atividades como pular, correr, chutar, subir e descer escadas, andar em linha reta ou curvada. Solicitar à criança que realize testes específicos de coordenação motora grossa, como saltar em um pé só, andar em uma linha, lançar uma bola ou pegar um objeto em movimento.
-Coordenação motora fina: Observar a destreza manual da criança em atividades como segurar objetos, desenhar, escrever, abotoar botões ou amarrar cadarços. Solicitar à criança que realize testes específicos de coordenação motora fina, como tocar o dedo indicador no nariz, realizar movimentos de alternar o polegar e o indicador etc.
-Teste dedo-nariz: Solicitar ao paciente que toque a ponta do nariz com o dedo indicador. Observar a precisão e a coordenação do movimento.
-Teste calcanhar-joelho: Solicitar ao paciente que leve o calcanhar de um pé até a canela da outra perna. Observar a precisão e a coordenação do movimento.
-Teste diadococinesia: Solicitar ao paciente que realize movimentos rápidos e alternados de pronação e supinação das mãos. Observar a fluidez e a coordenação dos movimentos.
Nervos cranianos
A avaliação da integridade dos pares de nervos cranianos é parte importante do exame neurológico, permitindo a detecção de disfunções focais e a localização de lesões no sistema nervoso central. O processo envolve a análise dos doze pares de nervos cranianos, testando separadamente suas funções sensoriais, motoras e autonômicas. Vamos destacar as principais funções motoras e algumas sensoriais.
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I° par (nervo olfatório): Pode ser avaliado solicitando-se que a criança identifique o cheiro de algo comum, como café, hortelã, canela, por exemplo, em uma narina de cada vez e com oclusão da narina contralateral.
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II° par (nervo óptico): Observar a fixação do olhar a objetos ou pessoas, realizar exame oftalmológico incluindo o exame de fundo de olho (acuidade visual, campos visuais) Lembrar que nervo óptico é responsável pela via aferente do reflexo fotomotor.
-Reflexo fotomotor direto = miose após estímulo luminoso.
-Reflexo consensual: miose no olho não estimulado pela luz.
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III° par (nervo oculomotor): Avaliado através da motricidade ocular extrínseca (elevação, depressão e adução do globo ocular), posicionando-se um estímulo luminoso em várias direções. O terceiro par também é responsável pela eferência do reflexo fotomotor (constrição pupilar) e abertura da pálpebra.
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IV° par (nervo troclear): Avaliado através da motricidade ocular extrínseca (obliquidade superior), posicionando-se um estímulo luminoso em direção oblíqua superior.
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V° par (nervo trigêmeo): Avaliado pela observação da da força dos músculos mastigadores e da sensibilidade facial (ao toque, dor, temperatura).
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VI° par (nervo abducente): Avaliado através da motricidade ocular extrínseca (abdução do globo ocular), posicionando-se um estímulo luminoso em direção lateral.
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VII° par (nervo facial): Responsável pela motricidade facial, podendo ser avaliado observando-se a simetria facial em repouso e durante movimentos (choro, sorriso, franzir a testa). Também responsável pelo paladar (2/3 anteriores da língua).
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VIII° par (nervo vestíbulo-coclear): Nervo da audição e do equilíbrio. Avaliado através da estimulação auditiva com objeto sonoro. Também pode ser avaliado pelo reflexo cócleo-palpebral. Observa-se piscamento após estimulo auditivo (por exemplo, bater palma) próximo ao ouvido.
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IX° par (nervo glossofaríngeo): Nervo da deglutição (juntamente com o nervo vago), avaliado através da inserção de uma espátula na boca para se observar a migração da úvula e a presença do reflexo nauseoso. Também é responsável pelo paladar no 1/3 posterior da língua.
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X° par (nervo vago): Nervo responsável pela fonação, deglutição, controle da frequência cardíaca e respiratória, motilidade gástrica, paladar do palato mole. Pode ser avaliado também pelo reflexo nauseoso e pela voz.
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XI° par (acessório): é responsável pela inervação do músculo esternocleidomastóideo e trapézio. É avaliado observando-se os movimentos da cabeça e ombros. Testar a força dos músculos esternocleidomastoideo e trapézio.
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XII° par (hipoglosso): Pode ser avaliado pelos movimentos de protrusão e desvio da língua.
Reflexos primitivos
Os reflexos primitivos são respostas automáticas e estereotipadas a estímulos externos específicos. Servem como indicadores do amadurecimento neurológico e do desenvolvimento motor da criança. Estão presentes ao nascimento, mas a maioria deles desaparece com o tempo, à medida que surgem os reflexos posturais e a criança adquire controle voluntário sobre seus movimentos. Sua presença no neonato demonstra integridade de seu sistema nervoso, embora sua persistência além de sua duração habitual, possa denotar alguma disfunção neurológica.
1. Reflexo de sucção (até 2 meses): Este reflexo, que surge a partir da 34ª semana de gestação, é um dos mais importantes, pois o RN depende dele para se alimentar após o nascimento. É desencadeado pela estimulação dos lábios. Observa-se sucção vigorosa. Sua ausência é sinal de disfunção neurológica grave.
2. Reflexo de procura ou dos quatro pontos cardeais (até 2 meses): É desencadeado por estimulação da face ao redor da boca. Observa-se rotação da cabeça na tentativa de “buscar” o objeto, seguido de sucção reflexa do mesmo. Ao tocar com o dedo as comissuras labiais, o recém-nascido procurará o local do estímulo. Ao tocar o lábio superior ou inferior, ele abre a boca.
3. Reflexo de preensão palmar (até 4 meses): É desencadeado pela pressão da palma da mão. Observa-se flexão dos dedos. Coloca-se um dedo na região palmar e o RN irá fechar a mão segurando o dedo do examinador.
4. Reflexo Gallant (até 3 meses): Recém-nascido em decúbito ventral, cabeça centrada. Ao estimular sua musculatura paravertebral de cima para baixo, ele faz uma flexão da coluna com encurtamento do tronco do lado estimulado. Deverá ser pesquisado bilateralmente.
5. Reflexo de preensão plantar (até 12 meses): Estimula-se fazendo pressão com um dedo na base dos dedos do pé do neonato e ele irá flexioná-los.
6. Reflexo cutâneo plantar de extensão (equivalente ao Babinski) (até 1 ano): Faz-se um estímulo na região lateral externa do pé, no sentido do calcanhar para os dedos, ele deverá responder com extensão dos dedos.
7. Reflexo de marcha automática (até 8 meses): Segure o RN pelas axilas mantendo-o em posição vertical com os pés tocando alguma superfície plana. É desencadeado por inclinação do tronco do RN após obtenção do apoio plantar. Observa-se cruzamento das pernas, uma à frente da outra. O bebê fará movimentos alternados das pernas, como se estivesse caminhando.
8. Reflexo de propulsão ou réptil (até 1 mês): Recém-nascido em decúbito ventral. Ao apoiar as superfícies plantares de seus pés, ele se movimenta para frente, se arrastando como um réptil.
9. Reflexo de Moro ou do abraço (até 4 a 6 meses): Deixar o recém-nascido em decúbito dorsal, segurá-lo pelas mãos elevando seu tórax até aproximadamente 3 cm da superfície. Ao soltar suas mãos, observa-se extensão e abdução dos membros superiores (como um abraço) seguida por choro. Também desencadeado por queda súbita da cabeça do neonato.
10. Reflexo tônico cervical assimétrico ou “esgrimista” (aparece aos 2 meses e desaparece aos 4 meses): Mantendo o recém-nascido em decúbito dorsal com o tronco estabilizado com uma das mãos do examinador, enquanto a outra mão gira sua cabeça lateralmente. Observa-se extensão do braço do mesmo lado, enquanto o outro é flexionado. Essa postura se assemelha à posição de esgrima.
Reflexos posturais
Os reflexos posturais representam respostas motoras automáticas que controlam o tônus muscular, a postura e o equilíbrio, permitindo o desenvolvimento de habilidades motoras mais complexas. Modulam a distribuição do tônus muscular nos membros e tronco e, dessa forma, permitem o controle da cabeça, do tronco e membros sendo importantes para as habilidades de sentar, engatinhar, andar, entre outras. Persistem ao longo da vida, se adaptando e se refinando com o desenvolvimento motor e a aprendizagem.
Alguns exemplos:
-Reflexo de Landau
É desencadeado quando o bebê é suspenso na posição prona. Observa-se elevação da cabeça acima do tronco. Em seguida o tronco é retificado e as pernas estendidas. Quando o examinador flete a cabeça, as pernas se fletem. Representa o desenvolvimento do controle postural e antigravidade, preparando para o engatinhar e andar. Está presente a partir de 4 a 6 meses de idade.
-Reflexo do paraquedas
É desencadeado colocando-se a criança de ponta cabeça. Observa-se a extensão dos braços para frente, como se para amparar a queda. Representa o desenvolvimento da proteção contra quedas e controle do equilíbrio. É o último reflexo postural a aparecer. Está presente a partir de 8 a 9 meses de idade. Deve estar obrigatoriamente presente aos 12 meses.
-Reflexo do apoio lateral
É desencadeado lateralizando-se o tronco do bebê sentado. Observa-se extensão do braço ipsilateral ao lado da queda, com apoio da palma da mão na maca. Está presente a partir de 6 a 8 meses de idade.
Marcha reflexa
Reflexo de Moro
Avaliação da sensibilidade
A avaliação da sensibilidade permite a detecção de déficits sensoriais que podem ser causados por diversas condições neurológicas, como lesões medulares, doenças desmielinizantes, neuropatias entre outras. A correlação entre a área de sensibilidade alterada e a raiz nervosa envolvida pode ser identificada no mapa de dermátomos.
Tipos de Sensibilidade
Sensibilidade superficial:
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Tátil: avaliada com toque leve de um algodão ou pincel.
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Dolorosa: avaliada com picada de alfinete.
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Térmica: avaliada com tubos de ensaio contendo água quente ou fria.
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Protopática: sensibilidade grosseira.
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Epicrítica: sensibilidade discriminativa.
Sensibilidade profunda:
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Vibratória: avaliada com diapasão.
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Posicional: avaliada com movimentação passiva dos dedos das mãos e pés.
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Estereognosia: capacidade de reconhecer objetos com as mãos sem olhar.
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Grafestesia: capacidade de reconhecer letras ou números escritos na palma da mão.
Detalhes Semiológicos:
É importante sempre comparar a sensibilidade de um lado com o outro lado. As variações da sensibilidade podem ser:
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Anestesia: perda total da sensibilidade em uma área.
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Hipoestesia: diminuição da sensibilidade em uma área.
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Hiperestesia: aumento da sensibilidade em uma área.
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Parestesia: sensação anormal, como formigamento, queimação ou dormência.
Desenvolvimento cognitivo
A cognição é o resultado de diversas funções cerebrais complexas que, em conjunto, permitem ao ser humano pensar, aprender, lembrar, solucionar problemas, se comunicar e interagir com o mundo ao seu redor. Sempre que houver suspeita de déficit cognitivo, a criança deve passar por uma avaliação neuropsicológica (idealmente a partir de 6 anos de idade). Um aspecto que pode dar uma idéia do desenvolvimento cognitivo é a análise do desenvolvimento da linguagem. Uma outra alternativa é a avaliação de determinadas características de desenhos realizados pela criança, tais como tamanho e proporção, riqueza de detalhes, escolha de cores e a forma como elas são utilizadas, o uso do espaço etc. Essas características podem evidenciar alguns aspectos relacionados direta ou indiretamente com a cognição, tais como, desenvolvimento espacial, capacidade de percepção, atenção, memória, concentração, organização mental, autoestima, sentimento de segurança, estado emocional, entre outros. Algumas das principais funções cerebrais cognitivas, incluem:
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Atenção: A capacidade de focar em uma tarefa ou estímulo específico. Ela se divide em diferentes tipos, como atenção seletiva (focar em um estímulo específico enquanto ignora outros), atenção sustentada (manter o foco por um período prolongado) e atenção dividida (focar em duas ou mais tarefas ao mesmo tempo).
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Interpretação: A capacidade de interpretar e dar significado aos estímulos recebidos através dos órgãos sensoriais.
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Memória: A capacidade de armazenar e recuperar informações. Ela se subdivide em memória de curto prazo e memória de longo prazo.
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Linguagem: A capacidade de compreender e se comunicar por meio de linguagem falada ou escrita.
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Raciocínio: A capacidade de elaborar e processar informações, formular ideias e solucionar problemas.
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Aprendizagem: A capacidade de adquirir novos conhecimentos e habilidades.
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Praxia: A capacidade de realizar movimentos coordenados e complexos com objetivos definidos.
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Gnosia: A capacidade de reconhecer e identificar objetos, pessoas e lugares.
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Emoção: A capacidade de sentir e expressar sentimentos.
Além desses componentes básicos do processo cognitivo, a cognição também envolve funções executivas (capacidade de planejamento, organização, autocontrole, adaptação, tomada de decisão) e habilidades sociais (comunicação, empatia, interação social).
Sinais de irritação meníngea
Os sinais clássicos que indicam irritação meníngea (por exemplo em casos de meningite) são:
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Rigidez de nuca: Dificuldade em flexionar o pescoço (queixo em direção ao peito) devido à rigidez dos músculos da nuca.
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Sinal de Brudzinski: Flexão involuntária dos quadris e joelhos quando o pescoço é flexionado passivamente.
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Sinal de Kernig: Com o quadril e o joelho flexionados a 90 graus, a criança refere dor quando o examinador realiza uma extensão passiva da perna sobre a coxa.
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Sinal de Lasegue: Com a criança em decúbito dorsal, ela refere dor quando o examinador realiza elevação passiva do membro inferior em extensão.
Os sinais clássicos de irritação meníngea, como rigidez de nuca, Brudzinski, Kernig e Lasegue, podem estar ausentes ou menos evidentes lactentes. Nessa faixa etária, a fontanela anterior abaulada, pode ser um sinal indireto de irritação meníngea.
Paralisia cerebral
A chamada paralisia cerebral ou encefalopatia crônica não progressiva, se refere a um conjunto de transtornos motores ocasionados por lesões cerebrais que se instalaram durante o período fetal ou muito precocemente na vida do recém-nascido ou lactente (antes dos 2 anos de idade). A criança com paralisia cerebral apresenta prejuízo motor não evolutivo com desordem do movimento e da postura, como por exemplo, rigidez ou fraqueza muscular, dificuldade de coordenação e equilíbrio, tremores, entre outros. Frequentemente é acompanhada de epilepsia, distúrbios neurossensorias e cognitivos (deficiência intelectual), transtornos da percepção, comunicação e comportamento (autismo), e outros.
As causas da paralisia cerebral variam muito, sendo as mais frequentes, as infecções congênitas (sindrome STORCH), meningoencefalites, hipóxia prolongada de diversas causas, complicações da prematuridade, hipoglicemia, encefalopatia hipóxico-isquêmica, síndromes genéticas, anomalias congênitas do sistema nervoso central etc.
A encefalopatia crônica não progressiva (ECNP) pode ser classificada conforme os critérios a seguir:
Alteração do tônus muscular:
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ECNP espástica (tipo mais comum, rigidez ou hipertonia muscular)
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ECNP discinética ou atetóide (movimentos involuntários e incontroláveis)
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ECNP atáxica (alteração no equilíbrio e coordenação motora)
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ECNP hipotônica (fraqueza ou hipotonia muscular)
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ECNP mista (associação de mais de um tipo)
Topografia da lesão cerebral:
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ECNP hemiplégica (paralisia em apenas um dimídio) ou hemiparética (paresia em apenas um dimídio)
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ECNP diplégica (paralisia nos membros inferiores) ou diparética (paresia nos membros inferiores)
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ECNP tetraplégica (paralisia nos quatro membros) ou tetraparética (paresia nos quatro membros)
- Gravidade dos sintomas:
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ECNP leve (pouca dificuldade de movimento e postura)
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ECNP moderada (maior dificuldade para de movimento/postura e dificuldade de se comunicar)
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ECNP grave (necessita ajuda para realizar as atividades básicas cotidianas)
As formas mais graves da paralisia cerebral, estão sujeitas a maior número de complicações que envolvem, além dos problemas neurológicos, também problemos ortopédicos, gastroenterológicos, respiratórios, entre outros.
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Problemas ortopédicos:
Luxação do quadril, escoliose, osteopenia/osteoporose, contratura tendíndea, deformidades variadas.
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Problemas gastroeneterológicos:
Distúrbio da deglutição, refluxo gastroesofágico, constipação intestinal, fecaloma, problemas com a gastrostomia.
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Problemas respiratórios:
Acúmulo de secreções por dificuldade de tossir, broncoaspiração, pneumonia, obstrução de vias aéreas, problemas com a traqueostomia.
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA
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