
ASMA EM CRIANÇAS
E ADOLESCENTES
Asma em Crianças e Adolescentes
Introdução
A asma é uma doença inflamatória crônica das vias aéreas, de caráter heterogêneo, caracterizada por episódios recorrentes de sibilância, tosse (frequentemente exacerbada durante a noite ou nas primeiras horas da manhã), dispneia e sensação de opressão torácica. As manifestações clínicas variam em frequência, duração e intensidade, estando habitualmente associadas à limitação variável do fluxo aéreo e à hiperresponsividade brônquica (resposta exagerada das vias aéreas devido a estímulos diversos, como alérgenos, infecções virais, exercício físico, mudanças de temperatura, entre outros). A obstrução ao fluxo aéreo é intermitente, mas em casos mais graves ou mal controlados, pode evoluir para um quadro de limitação persistente. Do ponto de vista epidemiológico, a asma se configura como uma das principais causas de morbidade crônica na infância, afetando entre 10% e 15% da população pediátrica mundial, com variações substanciais conforme fatores geográficos, socioeconômicos e étnicos.
A etiopatogenia da asma resulta de uma interação complexa entre predisposição genética, fatores ambientais e mecanismos epigenéticos, que influenciam a resposta inflamatória das vias aéreas. A influência genética na asma é amplamente reconhecida, com a identificação de múltiplos genes associados à doença, particularmente aqueles envolvidos na resposta imune e na regulação das vias inflamatórias. Todavia, os fatores ambientais desempenham papel crucial, com a exposição a alérgenos, infecções virais respiratórias e poluentes atmosféricos sendo extensamente documentados como fatores de risco.
Fisiopatologia
A fisiopatologia da asma envolve três principais processos:
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Inflamação das vias aéreas
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Broncoconstrição (broncoespasmo)
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Remodelamento das vias aéreas (em casos crônicos)
Na asma, a inflamação é o principal aspecto da doença e envolve uma resposta exacerbada do sistema imunológico: a exposição a um estímulo (alérgeno, infecção, irritante ambiental) ativa células imunes das vias aéreas, como células dendríticas, mastócitos e macrófagos. Essas células liberam mediadores inflamatórios (histamina, prostaglandinas, leucotrienos), que:
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Aumentam a permeabilidade vascular (causando edema da mucosa)
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Estimulam a secreção de muco pelas glândulas
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Promovem o recrutamento de outras células inflamatórias (principalmente eosinófilos, linfócitos T e basófilos)
Além disso, eosinófilos liberam proteínas tóxicas e citocinas que danificam o epitélio das vias aéreas, perpetuando a inflamação e aumentando a hiperresponsividade brônquica. Com o tempo, a inflamação persistente pode provocar o remodelamento das vias aéreas, caracterizado por hipertrofia da musculatura lisa e fibrose do tecido conjuntivo, o que resulta em maior resistência e menor complacência dos tecidos do sistema respiratório.
Fase inicial – Sensibilização e Ativação imunológica
Após a captura do antígeno (ácaros, pólens, vírus etc.) pelas células dendríticas, estas o apresentam aos linfócitos T CD4+, que se diferenciam em linfócitos Th2, os quais produzem citocinas-chaves no processo inflamatório da asma:
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IL-4: estimula produção de IgE pelos linfócitos B
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IL-5: recruta e ativa eosinófilos
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IL-13: induz hipersecreção de muco, hiperresponsividade brônquica e ajuda na produção de IgE
Na sequência, os mastócitos ativados pela ligação do antígeno ao IgE de superfície, liberam imediatamente mediadores (histamina, prostaglandinas e leucotrienos), causando broncoespasmo imediato.
Fase de Inflamação Tardia
Essa fase tem início algumas horas (geralmente 4-8 horas) após a exposição inicial e pode persistir por várias horas ou até dias. É caracterizada pelo recrutamento e ativação de outras células inflamatórias nas vias aéreas, incluindo eosinófilos, linfócitos, neutrófilos e basófilos.
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Eosinófilos → liberam proteína básica maior (MBP) e proteína catiônica eosinofílica (ECP), que danificam o epitélio.
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Neutrófilos (em formas mais graves e não alérgicas de asma) → aumentam ainda mais a inflamação.
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Linfócitos Th17 (em alguns fenótipos mais severos) → produzem IL-17, recrutando neutrófilos.
Como consequência da ativação da cascata inflamatória, ocorrem:
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Edema da mucosa.
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Aumento da produção de muco e hipersecreção.
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Broncoconstrição (contração do músculo liso brônquico).
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Dano do epitélio, expondo terminações nervosas e aumentando a sensibilidade das vias aéreas.
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Remodelamento das vias aéreas: Essa fase caracteriza a asma crônica e contribui para uma obstrução do fluxo aéreo mais duradoura e menos reversível, resultando em aumento permanente da resistência das vias aéreas. Esse processo envolve fibrose subepitelial (mediada pelo TGF-β), hipertrofia da musculatura lisa e angiogênese. O TGF-β estimula a produção de colágeno e de outras proteínas da matriz extracelular, promovendo reparo tecidual e fibrose.

O curso clínico da asma é marcado por períodos de exacerbação de intensidade variável e por períodos de intercrise, durante os quais o paciente permanece assintomático ou apresenta sintomas mínimos. As exacerbações podem variar desde apresentações leves até quadros graves, com insuficiência respiratória. A doença é crônica e impacta negativamente na função pulmonar e na qualidade de vida.

Remodelamento das vias aéreas: Processo de longo prazo que envolve fibrose subepitelial, hipertrofia da musculatura lisa e angiogênese. Fibroblastos são estimulados a aumentar a produção de colágeno e de outras proteínas da matriz extracelular. Essas modificações estruturais nas vias aéreas as tornam mais rígidas, resultando em aumento permanente da resistência das vias aéreas.

Diagnóstico de Asma em Crianças e Adolescentes
O diagnóstico de asma em crianças e adolescentes pode ser desafiador devido à variabilidade dos sintomas, sobreposição com outras doenças respiratórias e limitações na realização de exames de espirometria em faixas etárias menores (abaixo de 6 anos de idade). O diagnóstico deve basear-se em uma combinação de história clínica detalhada, exame físico e testes de função pulmonar, quando disponíveis.
Anamnese
A identificação de padrões típicos de sintomas respiratórios é essencial. Os sintomas clássicos, relacionados à asma, incluem:
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Sibilância recorrente
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Tosse crônica, principalmente noturna ou desencadeada por exercício, riso ou exposição a alérgenos
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Dispneia episódica
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Sensação de aperto no peito
A presença de fatores desencadeantes reforça a suspeita diagnóstica, especialmente quando relacionados a infecções virais, mudanças climáticas, atividade física, poluentes e irritantes das vias aéreas (ex.: pelos de animais, ácaros, fungos, baratas, pólen e exposição ao tabaco), além do uso de certos medicamentos, como aspirina e betabloqueadores. Esses sintomas tendem a ser variáveis e reversíveis espontaneamente ou com tratamento broncodilatador.
Exame Físico
O exame físico pode ser normal na ausência de sintomas. Quando presentes, os achados incluem sibilância expiratória difusa, prolongamento da expiração e hiperinsuflação pulmonar. No entanto, sua ausência não exclui o diagnóstico de asma.
Testes Diagnósticos
A espirometria está indicada em crianças a partir de 6 anos. O padrão típico inclui obstrução ao fluxo aéreo com reversibilidade significativa após broncodilatador. Em casos de sintomas compatíveis, mas espirometria normal, pode ser realizado o teste de broncoprovocação (ex.: exercício ou metacolina) com fração exalada de óxido nítrico.
Diagnóstico em crianças menores de 6 anos de idade
Estabelecer um diagnóstico confiável de asma em crianças menores de 6 anos é um desafio, pois mesmo aquelas que não têm a doença podem apresentar sintomas respiratórios recorrentes, como sibilância e tosse — especialmente nos primeiros dois anos de vida ou durante infecções virais. Além disso, nessa faixa etária, a avaliação precisa da limitação do fluxo aéreo e da resposta aos broncodilatadores por meio da espirometria não é viável.
Diversas doenças que cursam com sintomas respiratórios recorrentes devem ser consideradas no diagnóstico diferencial da asma em lactentes e pré-escolares. Entre elas, destacam-se as anormalidades estruturais das vias aéreas, o refluxo gastroesofágico com microaspiração recorrente, a fibrose cística, as imunodeficiências, a doença pulmonar crônica da prematuridade e a síndrome da bronquiolite obliterante, entre outras.
Portanto, em menores de 6 anos, o diagnóstico é baseado na probabilidade de asma, considerando o padrão dos sintomas, a presença de fatores de risco e a resposta ao tratamento:
Padrão dos Sintomas
Sintomas recorrentes de tosse, sibilância e/ou dificuldade respiratória, que:
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Ocorrem na forma de episódios agudos (com exacerbação dos sintomas) mais de 3 vezes por ano OU qualquer episódio com sintomas graves.
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Perduram por mais de 10 dias durante quadros de infecções respiratórias virais.
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Apresentam piora noturna.
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Se manifestam no período de intercrise (fora dos episódios agudos) principalmente durante exercícios físicos, brincadeiras, risos ou exposição à fumaça/tabaco/poluentes, na ausência de infecção respiratória.
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Limitação de atividades físicas em relação às outras crianças.
Fatores de Risco
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Presença de outra doença alérgica (dermatite atópica, rinite alérgica ou alergia alimentar).
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História familiar de alergia ou asma em parente(s) de primeiro grau.
Resposta Terapêutica
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Melhora clínica durante 2 a 3 meses de tratamento com corticosteroides inalatórios em dose baixa mais salbutamol (SABA) de alívio conforme necessário.
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Piora clínica após a interrupção do tratamento.
A partir dos seis anos de idade, a espirometria passa a ser viável, permitindo a avaliação objetiva da obstrução reversível do fluxo aéreo, critério fundamental para o diagnóstico de asma. Em adolescentes de 12 a 18 anos, o diagnóstico segue os critérios estabelecidos para adultos, embora devam ser consideradas peculiaridades dessa fase, como adesão ao tratamento, influência hormonal e aspectos psicossociais. O reconhecimento precoce e a adequada abordagem da asma na infância são fundamentais para reduzir a morbidade da asma, prevenir a deterioração da função pulmonar e melhorar a qualidade de vida dos pacientes.
Classificação da Asma
- Quanto ao Nivel de Controle
O nível de controle da asma é avaliado com base na frequência e intensidade com que os sintomas se manifestam, com base no risco de exacerbações graves e da redução da função pulmonar. A asma pode ser classificada, quanto ao nível de controle da doença, em três categorias:
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Asma controlada (bem controlada)
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Asma parcialmente controlada
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Asma não controlada
Para essa classificação, serão avaliados os seguintes aspectos (nas últimas quatro semanas):
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Teve sintomas diurnos de asma mais de 1 vez por semana semana?
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Acordou à noite devido a sintomas de asma?
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Precisou usar medicação de alívio (ex.: salbutamol) mais de 1 vez/semana?
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Teve limitação de suas atividades por causa da asma?
Classificação:
- Se todas as respostas forem "Não", então a asma está bem controlada
- Se houver 1 ou 2 respostas "Sim", então a asma está parcialmente controlada
- Se houver 3 ou 4 respostas "Sim", então a asma está não controlada
- Quanto à Gravidade
A asma pode ser classificada, quanto à gravidade, de acordo com a etapa de tratamento necessária para o controle da doença. (veremos as etapas de tratamento mais abaixo)
Classificação:
- Asma Leve: O controle da doença é obtido com o tratamento nas etapas 1 e 2
- Asma Moderada: O controle da doença é obtido com o tratamento nas etapas 3 e 4
- Asma Grave: O controle da doença só é obtido com o tratamento na etapas 5
Tratamento
Por sua natureza persistente e multifatorial, o tratamento da asma requer uma abordagem contínua e individualizada, tendo como principais objetivos:
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Controlar os sintomas da doença
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Reduzir a frequência e intensidade das exacerbações
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Reduzir a necessidade de medicação de alívio
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Manter a função pulmonar próxima ao normal
Dessa forma, o tratamento da asma visa alcançar e manter o controle clínico da doença, melhorar a qualidade de vida dos pacientes e prevenir a limitação de suas atividades cotidianas. O bom controle da asma pode ocorrer por meio de intervenções farmacológicas associadas a estratégias não farmacológicas, como controle ambiental, medidas educacionais e acompanhamento ambulatorial regular. A prescrição de medicamentos deve vir acompanhada de treinamento para o uso adequado dos dispositivos inalatórios, sendo que a eficácia do tratamento dependerá, em grande parte, da adesão ao plano terapêutico.
Intervenções Farmacológicas
Os principais medicamentos utilizados no tratamento da asma são:
Medicações de controle:
- Corticosteroides inalatórios (C.I.) Ex.: Beclometasona, Budesonida, Fluticasona, outros...
- Beta agonistas de longa ação (LABA) Ex.: Salmeterol, Formoterol
Medicações de alívio:
- Beta agonistas de curta ação (SABA) Ex.: Salbutamol
- C.I. + SABA
- C.I. + Formoterol
Medicações de manutenção e alívio (MART):
- C.I. + Formoterol
Outros medicamentos utilizados no tratamento manutenção da asma:
- Antagonistas de receptores de leucotrienos (LTRA) Ex.: Montelucaste
- Antagonistas muscarínicos de longa ação (LAMA) Ex.: Tiotrópio
Imunobiológicos (anticorpos monoclonais):
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Anti- IgE - Ex.: Omalizumabe
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Anti receptor da IL4 (interleucina 4) - Ex.: Dupilumabe
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Anti- IL5 (interleucina 5) - Ex.: Mepolizumabe, Reslizumabe
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Anti-receptor da IL5 - Ex.: Benralizumabe
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Anti-TSLP (Linfopoietina do estroma tímico) - Ex.: Tezepelumabe

Dispositivos para inaloterapia
Principais dispositivos utilizados na inaloterapia
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Inaladores Pressurizados Dosimetrados (pMDI - Pressurized Metered-Dose Inhaler): são os sprays e aerossóis popularmente conhecidos como "bombinhas". Liberam uma dose fixa de medicamento em forma de aerossol. Em crianças, são utilizados juntos com espaçadores e máscara ou espaçadores e bocais.
Exemplos:
- Salbutamol spray 100 mcg/jato
- Beclometasona aerossol 50 mcg, 200 mcg ou 250 mcg/jato
pMDI + Espaçador e máscara
pMDI + Espaçador e bocal

O espaçador é um item fundamental para facilitar a inalação de medicamentos por crianças que utilizam dispositivos dosimetrados pressurizados (as chamadas 'bombinhas'). Ele é utilizado tanto no tratamento de manutenção da asma quanto durante as crises. Ao reter a medicação após a liberação do spray, o espaçador permite que a criança respire calmamente, favorecendo a absorção do medicamento e reduzindo sua dispersão no ambiente. O espaçador pode ser usado com máscara (crianças até 4 anos), ou sem a máscara (crianças a partir de 5 anos). Neste último caso, a criança respira pela boca utilizando o bocal do espaçador.
Passo a passo para o uso do espaçador com máscara
Para cada dose (cada jato), o processo abaixo deve ser repetido:
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Agite vigorosamente a bombinha, mantendo o bocal voltado para baixo.
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Encaixe a bombinha no espaçador.
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Coloque a máscara do espaçador sobre o rosto da criança, cobrindo bem o nariz e a boca. Certifique-se de que está bem ajustada, sem permitir vazamentos.
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Acione a bombinha (dispare o spray) e mantenha a máscara no rosto da criança, permitindo que ela respire normalmente por cerca de 10 a 20 segundos.
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Retire o espaçador com a máscara do rosto.
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Repetir o mesmo processo (1 ao 5) o número de vezes que corresponder à dose (número de jatos) prescritos.
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Após a última dose, é importante que a criança lave o rosto, a boca e os dentes ou faça bochecho e cuspa a água, para evitar efeitos colaterais locais do medicamento.
Passo a passo para uso do espaçador com bocal:
Para cada dose (cada jato) deve se repetir o processo abaixo.
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Agitar a bombinha vigorosamente, com o bocal para baixo
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Encaixar a bombinha no espaçador
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Coloque o espaçador na boca, entre os dentes da criança e peça para fechar os lábios;
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Disparar a bombinha em spray e esperar que a criança respire pela boca (pelo espaçador) por cerca de 10 a 20 segundos. (Tapar o nariz pode ajudar a criança a não respirar pelo nariz)
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Retire o espaçador da boca;
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Repetir o mesmo processo (1 a 5) o número de vezes que corresponder à dose (número de jatos) prescritos.
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Após a última dose, é importante que a criança lave a boca e os dentes ou faça bochecho e cuspa a água, para evitar efeitos colaterais locais do medicamento.

Outros dispositivos utilizados na inaloterapia
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Inaladores de Pó Seco (DPI – Dry Powder Inhaler): são dispositivos desenvolvidos pelos próprios laboratórios que produzem o medicamento. Medicação em pó, ativada pela inspiração do paciente. Requer fluxo inspiratório forte (em geral, crianças maiores e adolescentes). Não necessita coordenação entre ato de inspirar e liberar dose. Dispositivos mais utilizados são o Turbohaler, Diskus (accuhaler), Aerolizer (para apresentações de pó seco em cápsulas) entre outros.
Exemplos:
- Budesonida Turbohaler 100, 200 ou 400 mcg
- Formoterol Aerolizer 12 mcg (cápsulas para inalação)
- Fluticasona + Salmeterol Diskus (Accuhaler) 100/50, 250/50, 500/50 mcg
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Compressores (aparelhos de Nebulização): Nesse caso, os medicamentos são apresentados em solução líquida em frascos gotejadores. A dose é definida em número de gotas do medicamento que são, em geral, diluídas em soro fisiológico. Utilizadas preferencialmente em quadros de exacerbação grave, pois podem ser administradas juntamente com o oxigênio.
Exemplos:
- Salbutamol (solução) 5 mg/mL
- Brometo de Ipratrópio (solução) 0,25 mg/mL
Estratégia de Tratamento em Etapas
O tratamento da asma é estrategicamente escalonado em etapas porque a doença apresenta variabilidade na gravidade, nos sintomas e na resposta ao tratamento, exigindo uma abordagem individualizada e dinâmica. Desse modo, o modelo em etapas permite ajustar a intensidade da terapia de acordo com o nível de controle clínico apresentado pelo paciente ao longo do tempo.
Esse escalonamento tem como principais objetivos:
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Alcançar e manter o controle dos sintomas com a menor dose eficaz de medicação, reduzindo o risco de efeitos adversos
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Prevenir exacerbações e hospitalizações, por meio de intervenções precoces em casos de piora clínica
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Permitir ajustes terapêuticos graduais, tanto para intensificação (step-up) quanto para redução (step-down) do tratamento, baseando-se em avaliações regulares do controle da asma, adesão ao tratamento, técnica inalatória e presença de fatores desencadeantes.
Subindo ou descendo etapas ("stepping up" ou "stepping down")
No tratamento da asma em etapas, quando o quadro do paciente se encontra não controlado ou apenas parcialmente controlado, está indicada a progressão para a etapa superior. Por outro lado, em pacientes que alcançaram o controle da asma, pode-se considerar a regressão para a etapa inferior do tratamento, após pelo menos três meses de asma controlada. O acompanhamento médico deve ser sistematicamente a cada um a três meses. Lembrando que, antes de progredir a etapa nos casos mal controlados, devem ser descartados fatores como uso inadequado dos dispositivos inalatórios, baixa adesão ao tratamento, exposição a alérgenos ou irritantes ambientais e presença de comorbidades
O protocolo de tratamento varia de acordo com a faixa etária, com abordagens distintas em três faixas:
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Crianças menores de 6 anos
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Crianças entre 6 e 11 anos de idade
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Adolescentes a partir de 12 anos de idade.
Tratamento de crianças menores de 6 anos de idade
Em lactentes e pré-escolares, o plano terapêutico farmacológico pode ser escalonado em quatro etapas:
- Etapa 1:
Indicada para pacientes com asma controlada. Não há prescrição de medicação de uso contínuo. A intervenção farmacológica inclui o salbutamol e corticosteroide inalatório como medicações de alívio, somente durante as exacerbações de sintomas.
- Etapa 2:
Indicada para pacientes com sintomas não controlados ou que apresentem mais de três exacerbações por ano ou ainda após qualquer exacerbação grave. Nesses casos iniciar e manter corticosteroide inalatório em dose baixa diariamente e considerar fazer encaminhamento ao especialista. Como alternativa, considerar a adição de antagonista de receptor de leucotrieno.
- Etapa 3:
Indicada quando a etapa dois falha em controlar os sintomas da doença. Nesses casos, dobrar a dose de corticosteroide inalatório diário (dose média) e considerar fazer encaminhamento ao especialista. Como alternativa, considerar a adição de antagonista de receptor de leucotrieno.
- Etapa 4:
Indicada quando a etapa três falha em controlar os sintomas da doença. Nesses casos, manter a dose média de corticosteroide inalatório diário e encaminhar ao especialista. Como alternativa, considerar a adição de antagonista de receptor de leucotrieno ou aumentar a dose do corticosteroide inalatório.
Em qualquer momento, caso haja exacerbação de sintomas, iniciar medicação de alívio (Salbutamol) associado ao corticosteroide inalatório.
Tratamento da Asma em crianças menores de 6 anos

Referência: GINA, 2024
Tratamento de crianças de 6 a 11 anos de idade
Em crianças de 6 a 11 anos de idade, o plano terapêutico farmacológico pode ser escalonado em cinco etapas:
- Etapa 1:
Indicada para pacientes com asma controlada (com sintomas menos de 2 dias por semana). Não há prescrição de medicação de uso contínuo. A intervenção farmacológica inclui o salbutamol e corticosteroide inalatório como medicações de alívio, somente durante as exacerbações de sintomas.
- Etapa 2:
Indicada para pacientes com sintomas não controlados (com sintomas entre 2 a 5 dias por semana) ou que apresentem mais de três exacerbações por ano ou ainda após qualquer exacerbação grave. Nesses casos iniciar e manter corticosteroide inalatório em dose baixa diariamente e considerar fazer encaminhamento ao especialista. Como alternativa, considerar a adição de antagonista de receptor de leucotrieno.
- Etapa 3:
Indicada quando a etapa dois falha em controlar os sintomas da doença. Há sintomas na maioria dos dias OU despertares noturnos > 1 vez/semana OU exacerbação como apresentação inicial. Nesses casos, iniciar e manter dose baixa de corticoide inalatório + LABA OU dose média diária de C.I. OU Terapia MART com dose muito baixa de C.I. + Formoterol. Como alternativa, considerar a adição de antagonista de receptor de leucotrieno.
- Etapa 4:
Indicada quando a etapa três falha em controlar os sintomas da doença. Há sintomas na maioria dos dias E despertares noturnos > 1 vez/semana E baixa função pulmonar. Nesses casos, encaminhar ao especialista OU iniciar e manter dose média diária de corticoide inalatório + LABA OU Terapia MART com dose baixa de C.I. + Formoterol. Como alternativa, considerar a adição de Antagonista de Receptor de Leucotrieno ou adicionar Tiotrópio.
- Etapa 5:
Indicada quando a etapa quatro falha em controlar os sintomas da doença. Nesses casos o paciente necessita acompanhamento com especialista, realizar avaliação fenotípica, usar dose máxima de corticoide inalatório diariamente + LABA OU terapia imunobiológica (Anti-IgE, anti IL-4R, anti-IL5). Como alternativa, considerar adicionar corticosteroide sistêmico oral em dose baixa).
Em qualquer momento, caso haja exacerbação de sintomas, iniciar medicação de alívio (Salbutamol) associado ao corticosteroide inalatório ou terapia MART (formoterol + corticoide inalatório) nas etapas 3 e 4.
Tratamento da Asma em crianças de 6 anos a 11 anos
Referência: GINA, 2024

Tratamento de adolescentes a partir de 12 anos de idade
Em adolescentes, a partir de 12 anos de idade, o plano terapêutico farmacológico pode ser escalonado em cinco etapas e a terapia MART com corticoide inalatório + Formoterol é a estratégia preferencial:
- Etapa 1 e 2:
Indicada para pacientes com sintomas menos de 3 a 5 dias/semana com função pulmonar normal ou levemente reduzida. Não há prescrição de medicação de uso contínuo. A intervenção farmacológica inclui dose baixa de corticosteroide inalatório associado com formoterol, apenas como medicações de alívio durante as exacerbações de sintomas. Como alternativa, considerar na etapa 1 o uso de corticoide inalatório + salbutamol como medicação de alívio e na etapa 2, dose baixa de corticoide inalatório diariamente.
- Etapa 3:
Indicada quando a etapa dois falha em controlar os sintomas da doença e os sintomas ocorrem na maioria dos dias OU o paciente apresenta despertar noturno > 1 x semana OU baixa função pulmonar. Nesses casos, iniciar e manter diariamente dose baixa de corticoide inalatório + Formoterol. Como alternativa, considerar dose baixa de corticoide inalatório + LABA diariamente.
- Etapa 4:
Indicada quando a etapa três falha em controlar os sintomas da doença e o paciente apresenta sintomas diários E despertar noturno > 1 x semana E Baixa função pulmonar OU exacerbação como apresentação inicial. Nesses casos, iniciar e manter diariamente dose média de corticoide inalatório + Formoterol. Como alternativa, considerar dose média de corticoide inalatório + LABA diariamente.
- Etapa 5:
Indicada quando a etapa quatro falha em controlar os sintomas da doença. Nesses casos o paciente necessita acompanhamento com especialista, adicionar Tiotrópio (LAMA). Encaminhar para avaliação fenotípica. Considerar dose alta de C.I. + Formoterol, Anti-IgE, anti-L5/5R anti-L4R, anti-TSLP). Como alternativa, considerar LTRA ou dose alta de corticoide inalatório + LABA, diariamente.
Em qualquer momento, caso haja exacerbação de sintomas, iniciar medicação de alívio com dose adicional de formoterol + corticoide inalatório (ou, alternativamente, salbutamol associado ao corticosteroide inalatório) .
Tratamento da Asma em adolescentes a partir de 12 anos
Referência: GINA, 2024

Corticosteroides inalatórios: a base do tratamento de manutenção da asma
Como se observa, a maior parte dos benefícios clínicos no tratamento de manutenção da asma é alcançada com o uso de corticosteroides inalatórios em baixas doses para a maioria dos pacientes. No entanto, como a resposta a esses medicamentos pode variar, alguns pacientes podem necessitar de doses médias caso a asma permaneça sem controle ou haja exacerbações frequentes, mesmo com boa adesão ao tratamento e técnica inalatória adequada. Nesses casos, a associação de corticosteroide inalatório (em dose baixa ou média) com um beta-agonista de longa ação (LABA) pode ser benéfica. Doses altas de corticosteroides inalatórios são indicadas apenas para uma minoria de pacientes e, quando utilizadas por tempo prolongado, aumentam o risco de efeitos adversos locais e sistêmicos, os quais devem ser cuidadosamente balanceados em relação aos possíveis benefícios clínicos.
Nesse sentido, é fundamental conhecer para cada corticosteroide inalatório, quais são as doses consideradas baixa, média ou alta.
Exemplos:
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Beclometasona (apresentações em aerossol 50 mcg/jato ou 200 mcg/jato ou 250 mcg/jato)
No mercado brasileiro, os aerossóis orais de beclometasona disponíveis atualmente utilizam formulações com partículas extrafinas veiculadas por HFA (hidrofluoroalcano), em dispositivos do tipo pMDI (inalador pressurizado dosimetrado).
Ou seja:
Tipo de dispositivo: pMDI (aerossol dosimetrado)
Propelente: HFA (hidrofluoroalcano)
Tamanho de partícula: Entre fina e extrafina
DOSES:
Crianças > 6 anos de idade e adolescentes:
- Dose diária baixa: 100 a 200 mcg
- Dose diária média: 200 a 400 mcg
- Dose diária alta: > 400 mcg
(Para crianças < 6 anos de idade, as doses correspondem à metade das doses das crianças > 6 anos: ou seja, dose baixa (50-100 mcg); média (100-200 mcg) e alta (> 200 mcg).
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Budesonida
No mercado brasileiro, os aerossóis orais de budesonida disponíveis atualmente utilizam formulações com partículas standart veiculadas por HFA (hidrofluoroalcano), em dispositivos do tipo pMDI (inaladores pressurizados dosimetrados).
Ou seja:
Tipo de dispositivo: pMDI (aerossol dosimetrado)
Propelente: HFA (hidrofluoroalcano)
Tamanho de partícula: standart
DOSES:
Crianças de 6 anos a 11 anos de idade:
- Dose diária baixa: 100 a 200 mcg
- Dose diária média: 200 a 400 mcg
- Dose diária alta: > 400 mcg
(Para adolescentes (>12 anos) as doses correspondem ao dobro das doses de crianças entre 6 a 11 anos: ou seja, dose baixa (200-400 mcg); média (400-800 mcg) e alta (> 800 mcg).
Plano de Ação
Um plano de ação para pacientes com asma deve ser um documento claro, personalizado e de fácil entendimento, voltado para orientar o paciente (ou seus cuidadores) sobre como identificar os sinais de agravamento da asma, ajustar o tratamento conforme a gravidade dos sintomas, e saber quando procurar ajuda médica. Ele deve ser elaborado pelo pediatra ou pneumopediatra e pode ser impresso ou digital, com linguagem acessível.
Plano de ação para asma por escrito
Todos os pacientes devem receber um plano de ação para asma por escrito (ou seja, impresso, digital ou ilustrado) apropriado para sua faixa etária. No plano de ação deve constar:
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Identificação do paciente com seus dados pessoais, diagnóstico, nível de controle da asma, nome do médico responsável, número de contato em situações de emergência
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Regime de tratamento atual com medicamentos de uso contínuo, dose, horários
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Medicação de alívio: salbutamol (isolado ou em combinação com corticoide inalatório) ou formoterol em combinação com corticoide inalatório
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Indicação de quando e como usar os medicamentos de alívio e/ou manutenção, usar corticosteroides orais, se necessário, e procurar atendimento médico caso os sintomas não respondam ao tratamento.

EXACERBAÇÃO
DA ASMA
Exacerbação da Asma
A asma se caracteriza por períodos com poucos ou nenhum sintoma (intercrise), intercalados com momentos de agravamento, denominados exacerbações. A adesão ao tratamento durante a fase intercrítica, associada ao controle ambiental, é fundamental para o controle da doença e prevenção das exacerbações.
As exacerbações são episódios agudos ou subagudos marcados por piora progressiva dos sintomas respiratórios típicos, como tosse, sibilância e dispneia, geralmente acompanhada de redução da função pulmonar. Podem ocorrer tanto em pacientes com diagnóstico prévio de asma quanto como primeira manifestação clínica da doença.
Diversos fatores podem atuar como gatilhos para as exacerbações, entre eles: infecções respiratórias virais (como rinovírus, influenza, adenovírus, vírus sincicial respiratório e coqueluche), exposição a alérgenos ambientais, poluentes atmosféricos, mudanças sazonais, esforço físico, alergia alimentar e baixa adesão ao tratamento de manutenção. Esses episódios são causas frequentes de absenteísmo escolar, atendimento em serviços de urgência e hospitalizações, com intensidade e duração variáveis.
Abordagem inicial
No serviço de urgência pediátrica, a exacerbação será diagnosticada e sua gravidade avaliada juntamente com a identificação da existência de fatores de risco para mortalidade por asma. Nos casos graves ou muito graves, utilizar o protocolo de atendimento sistemático da criança gravemente enferma (PALS/AHA):
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Impressão inicial pela observação da aparência (avaliação sumária do nível de consciência e capacidade de interagir), da respiração (ver e ouvir sinais de esforço respiratório) e da circulação (avaliar a cor do paciente).
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Monitorização, oxigênio e acesso vascular (M-O-V).
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Avaliação primária (A-B-C-D-E) avaliar respectivamente as vias aéreas, a respiração, circulação, disfunção neurológica e exposição do corpo para avaliação detalhada de lesões externas).
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As Avaliações Secundária e Terciária incluem a história direcionada e o exame físico, acompanhados de exames complementares quando indicados.
Nos casos graves atendidos no serviço de urgência e emergência, realizar uma breve anamnese e exame físico direcionados concomitantemente ao início imediato da terapia. Se o paciente apresentar sinais de uma exacerbação grave ou com risco de vida, o tratamento com SABA, oxigênio controlado e corticosteroides sistêmicos deve ser iniciado o quanto antes. Exacerbações mais leves geralmente podem ser tratadas até mesmo em um ambiente de atenção primária, dependendo dos recursos e da experiência da equipe.
Os principais aspectos clínicos a serem avaliados incluem:
Anamnese:
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Verificar se há diagnóstico prévio de asma, história familiar de asma, a frequência de exacerbações e internações, uso prévio de beta-2 agonista, de corticoides (oral e/ou inalatório).
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Momento do início da exacerbação e possíveis "gatilhos" (se conhecidos) ou causas incluindo aspectos ambientais.
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Gravidade do quadro, questionar sobre sintomas diurnos e noturnos, limitação aos exercícios, frequência da necessidade de resgate.
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Checar medicamentos de manutenção e medicação de alívio, doses prescritas, dispositivos, adesão ao tratamento, técnica de inalação, recentes ajustes de dose e resposta ao tratamento atual.
Identificar se há fatores de risco para evolução desfavorável (fatores de risco para mortalidade por asma):
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Histórico de asma quase fatal com necessidade de intubação e ventilação mecânica
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Hospitalização ou visita ao serviço de urgência devido à asma no último ano
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Uso atual ou interrupção recente de corticosteroides orais (um marcador da gravidade do evento)
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Interrupção do uso de corticosteroides inalatórios
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Uso excessivo de agonistas beta2 de curta ação (SABAs), especialmente o uso de mais de um frasco de salbutamol por mês
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Má adesão a medicamentos contendo corticosteroides inalatórios e/ou má adesão a (ou ausência de) um plano de ação para asma por escrito
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Histórico de doença psiquiátrica ou problemas psicossociais
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Alergia alimentar em paciente com asma
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Diversas comorbidades, incluindo pneumonia, diabetes e arritmias, foram independentemente associadas a um risco aumentado de morte após hospitalização por asma exacerbação
Exame físico:
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Aparência geral, nível de consciência, habilidade de completar frases.
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Frequência respiratória, utilização de musculatura acessória, tórax hiperinsuflado, retrações torácicas.
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Ausculta com presença de sibilos, verificar distribuição do MV, silêncio torácico.
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Saturação de O2: a hipoxemia é o melhor preditor de gravidade.
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Identificar fatores complicadores (ex: pneumonia, atelectasia, pneumotórax, anafilaxia).
Intensidade da Exacerbação
Avaliar o paciente quanto à intensidade do quadro, classificando a exacerbação em:
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Leve/moderada: paciente em bom estado geral, fala normal com frases completas, taquipneia ausente ou leve, esforço ausente, sibilos discretos difusos ou localizados, saturação 90 a 95% (> 6 anos) ou saturação normal (< 5 anos); prefere ficar sentado em vez de deitado. Frequência cardíaca: FC 100 - 120 (> 6 anos); FC < 150 (4 a 5 anos); FC < 180 (< 3 anos).
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Grave: paciente mais agitado, fala pausada entre palavras (no lactente: choro curto e mamadas interrompidas), senta-se inclinado para a frente, taquipneia, esforço moderado a intenso, sibilos bem evidentes difusos, saturação < 90% (> 6 anos) ou saturação < 92% (< 5 anos). Frequência cardíaca: FC > 120 (> 6 anos); FC > 150 (4 a 5 anos); FC > 180 (< 3 anos)..
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Muito grave (ameaça à vida): paciente confuso, letárgico ou sonolento, sudoreico, palidez ou cianose (no lactente: impossibilidade de mamar), taquipneia e esforço intensos, sibilos ausentes (tórax silencioso).
Exames complementares
Exames complementares devem ser solicitados apenas nos quadros graves ou muito graves que não respondem bem à terapia inicial ou quando apresentam piora clínica na evolução do tratamento. Os exames laboratoriais podem incluir hemograma, PCR, gasometria, eletrólitos e hemocultura (caso de pneumonia associada ou outro contexto de infecção bacteriana). A radiografia de tórax não é recomendada de rotina, mas pode ser útil para identificar complicações como pneumonia, atelectasia, pneumotórax, corpo estranho, entre outras.
Manejo farmacológico
Principais medicamentos utilizados no tratamento da exacerbação de asma no serviço de urgência:
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Oxigenoterapia
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Beta-2-agonistas de curta ação
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Anticolinérgico inalatório
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Corticosteróides sistêmicos/inalatórios
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Sulfato de magnésio
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Hidratação venosa
Oxigenoterapia
O oxigênio deve ser administrado para manter a saturação da criança idealmente entre 94 e 98% (pelo menos > 92%). As interfaces mais utilizadas no serviço de urgência e os respectivos fluxos de oxigênio e FiO2 de cada uma são especificadas abaixo:
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Cateter nasal (cânula nasal)
Fluxo de Oxigênio: máximo de 3-4 litros/min
FiO2: 25 a 35%
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Máscara simples
Fluxo de Oxigênio: mínimo de 6 e máximo de 10 litros/minuto
FiO2: 30 a 50%
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Máscara não reinalante com reservatório
Fluxo de Oxigênio: mínimo de 10 e máximo de 15 litros/min
FiO2: próximo de 100%
Beta-2-agonista de curta ação
O salbutamol inalatório é a medicação de resgate prioritária na exacerbação da asma. São duas apresentações:
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Solução 5 mg/ml (gotas) para nebulização (frasco com 10 mL)
Dose em cada nebulização: 1 gota para cada 2 Kg de peso (máximo de 20 gotas = 5 mg)
Diluir em 3 mL de soro fisiológico e nebulizar com máscara apropriada utilizando fluxo oxigênio de 6 a 10 litros por minuto.
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Spray 100 mcg/jato (frasco pressurizado com 200 doses)
Dose em cada inalação: 1 jato para cada 2 a 3 Kg de peso (máximo de 10 jatos)
Utilizar espaçador e máscara.
A dose calculada de salbutamol deve ser aplicada por 3 vezes com intervalos de 20 minutos entre elas, mantendo o paciente no oxigênio, para garantir que a saturação fique idealmente entre 94-98% ou pelo menos > 92%. Se não houver melhora satisfatória, o esquema pode ser repetido (mais 3 vezes com intervalos de 20 minutos entre cada). Após as duas primeiras horas de tratamento com salbutamol (20/20 minutos), se possível, espaçar o intervalo para 1 hora (1/1 hora). Progressivamente, na medida que o paciente for obtendo melhora, ir ampliando o intervalo para 2/2 horas, 3/3/ horas até 4/4 horas.
Atenção: Em caso de uso prolongado de salbutamol ficar atento para o risco de hipopotassemia e hiperglicemia (considerar hidratação venosa).
Anticolinérgico inalatório
Brometo de Ipratópio
Considerar seu uso concomitante com o salbutamol no tratamento inicial das exacerbações mais graves.
Apresentações:
- Solução 250 mcg/ml (gotas) para nebulização (frascos com 20 mL):
Dose: 250 mcg (20 gotas) de brometo de ipratrópio associado ao salbutamol nas nebulizações a cada 20 minutos durante a primeira hora, em casos de exacerbação grave ou muito grave.
- Aerossol 20 mcg/jato (frascos com 200 doses):
Dose: 80 a 160 mcg (4 a 8 jatos) na primeira hora, em casos de exacerbação grave ou muito grave. As inalações de brometo de ipratrópio devem ser realizadas a cada 20 minutos (ex.: 2 jatos de 20/20 minutos), imediatamente após as doses do salbutamol.
O tempo de uso do brometo de ipratrópio não deve ultrapassar as primeiras 2 horas do tratamento da crise, pois não há evidência de eficácia após esse período.
Corticosteroides sistêmicos
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Prednisolona ou prednisona
Dose: 1-2 mg/Kg/dia (máximo 60mg), via oral
Apresentação: xarope 3 mg/mL (frascos com 60 ou 120 mL); comprimidos de 5 ou 20 mg (caixas com 10 ou 20 comprimidos).
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Hidrocortisona
Dose: 4 mg/Kg/dose a cada 4 – 6h (máximo de 250mg/dose), via endovenosa
Apresentação: Frascos com 100 mg ou 500 mg
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Metilprednisolona:
Dose: 1 mg/kg/dose a cada 4–6h (máximo de 60mg), via endovenosa
Apresentação: Frascos de 125 mg ou 500 mg
O corticoide deve ser administrado assim que possível, preferencialmente na primeira hora. Seus efeitos iniciais podem ser notados dentro de duas a quatro horas da administração. Considerando que os corticosteroides apresentam a mesma eficácia quando administrados por via oral ou por via endovenosa, preferir administração oral, sempre que possível.
Sulfato de magnésio
O sulfato de magnésio intravenoso não é recomendado para uso rotineiro em exacerbações de asma. No entanto, quando administrado como uma infusão única de 50 mg/kg (máximo de 2 g) ao longo de 20 a 30 minutos, reduz as internações hospitalares em alguns pacientes. O sulfato de magnésio venoso é indicado para casos de exacerbações graves que não responderam adequadamente à terapia com salbutamol, brometo de ipratrópio e corticosteroide sistêmico. Idealmente deve ser administrado na sala de emergência para que a criança seja adequadamente monitorizada durante sua infusão.
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Posologia: 50 mg/kg/dose (dose máxima 2 g)
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Apresentação: Ampolas com 10 ml
- Sulfato de Magnésio 10% (100 mg/mL)
- Sulfato de Magnésio 50% (500 mg/mL) -
Infusão venosa:
Diluir a dose de sulfato de magnésio em Soro Fisiológico para uma concentração de 20 mg/mL
Infundir EV em 20-30 minutos em B.I.C.
Se infundido mais rápido, pode causar hipotensão, bradicardia, rubor cutâneo, náuseas, fraqueza muscular. Durante a infusão, monitorar sinais vitais e aferir PA ao menos uma vez. Se houver hipotensão/bradicardia, rubor cutâneo, etc., interromper a infusão até melhora e posteriormente aumentar o tempo de infusão para 2h.
Hidratação venosa
A hidratação venosa tem indicação nas seguintes situações:
(1) Quando o paciente com exacerbação de asma se encontra desidratado. Neste caso, iniciar expansão com soro fisiológico 20 mL/Kg/hora até que os sinais de desidratação desapareçam.
(2) Em crises graves ou muito graves quando o paciente, embora não esteja desidratado, não responde adequadamente ao tratamento nas primeiras duas horas com salbutamol, brometo de ipratrópio e corticosteroide sistêmico *.
(3) Toda vez que o paciente estiver sem ingesta oral por período maior que 6 horas *.
(4) Em caso de hipopotassemia (K+ sérico < 3,3 mEq/L) **.
* Nos casos (2) e (3) iniciar hidratação venosa de manutenção isotônica, 100% das necessidades hídricas diárias, com soro glicosado 5%, cloreto de sódio (136 mEq/L de Na+) e cloreto de potássio (25 mEq/L de K+).
** No caso (4), tratar a hipopotassemia aumentando a concentração de potássio na hidratação venosa de manutenção para 40 mEq/L. Se K+ sérico for menor que 3 mEq/L, fazer reposição de 0,3 a 0,5 mEq/Kg/h em 3 a 4 horas, numa concentração máxima de 60 mEq/L em veia periférica.
Planejamento e acompanhamento após a alta do serviço de urgência
No momento da alta do serviço de urgência para casa, o paciente (ou seus cuidadores) devem ser orientados a fazer um agendamento de consulta com o(a) pediatra ou especialista nos próximos dias. Além da prescrição de medicamentos, orientar estratégias para melhorar o manejo da asma, incluindo a higiene ambiental e treinamento de habilidades com os inaladores. Refazer ou conferir se o paciente possui um plano de ação por escrito. Para os pacientes que não faziam uso de medicação de manutenção, prescrever tratamento contínuo com corticosteroide inalatório em dose baixa para reduzir o risco de novas exacerbações. Para os pacientes que já estavam no curso de um tratamento, considerar progredir a etapa, aumentando dose ou adicionando novos medicamentos.
LEIA MAIS...
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GLOBAL INITIATIVE FOR ASTHMA. Global Strategy for Asthma Management and Prevention. 2024. Disponível em: https://ginasthma.org/2024-gina-main-report/. Acesso em: 08 nov. 2024.
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CHONG NETO, H. J. et al. Diretrizes da ASBAI e SBP para sibilância e asma no pré-escolar. Arq Asma Alerg Imunol. v. 2, n. 2, p. 163-208, 2018.

INSUFICIÊNCIA RESPIRATÓRIA AGUDA
Introdução
A insuficiência respiratória aguda em pediatria é uma condição crítica caracterizada pela incapacidade do sistema respiratório manter as trocas gasosas adequadas, resultando em hipoxemia, hipercapnia ou ambos. Esta condição pode ser desencadeada por diversas causas, incluindo infecções respiratórias (bronquiolite, pneumonias graves), asma e outras doenças pulmonares e extrapulmonares. É uma das principais causas de morbidade e mortalidade em pediatria, especialmente em crianças menores de cinco anos. A identificação precoce dos sinais de insuficiência respiratória e a implementação imediata de intervenções adequadas são essenciais para reduzir a mortalidade e as complicações associadas, tornando este tema, uma prioridade no cuidado pediátrico em serviços de urgência e emergência.
A função essencial do sistema respiratório é realizar a troca gasosa, transportando o oxigênio do ar para a circulação sanguínea e retirando desta o dióxido de carbono produzido pelo metabolismo celular. Essa função é realizada por meio de dois processos interligados, embora distintos: a ventilação e a oxigenação.
Ventilação e Oxigenação
Ventilação
Ventilação é o processo de movimentação de ar para dentro e para fora dos pulmões, permitindo a renovação contínua dos gases respiratórios nas vias aéreas. Envolve a entrada de ar contendo oxigênio (O₂) e a eliminação de dióxido de carbono (CO₂) através da atividade mecânica da respiração, que inclui a contração e relaxamento dos músculos respiratórios, como o diafragma e os músculos intercostais. A ventilação é medida pela frequência respiratória e pelo volume corrente (volume de ar inalado ou exalado em cada respiração).
Oxigenação
Oxigenação é o processo de transferência de oxigênio dos alvéolos pulmonares para o sangue, onde se liga à hemoglobina, permitindo seu transporte a todo o organismo. Esse processo depende da difusão de O₂ através da membrana alvéolo-capilar. A oxigenação é influenciada pela pressão parcial de oxigênio (PaO₂) no ar inalado, pela integridade da membrana alvéolo-capilar, pelo fluxo sanguíneo nos capilares pulmonares (rede capilar perialveolar). Além disso, a chegada do oxigênio e sua difusão aos tecidos depende da hemoglobina, da circulação sanguínea e de níveis efetivos de pressão arterial.

Ar
ambiente
O₂
O₂
Via aérea superior e inferior
O₂
Alvéolos pulmonares
O₂
Membrana alveolo-capilar
O₂
Rede capilar perialveolar
O₂
hemoglobina
circulação sanguínea
O₂
Pressão arterial
O₂
Tecidos
sistema circulatório
sistema respiratório
O diagrama acima mostra, de modo simplificado, todo o transporte de oxigênio no organismo, desde o ar ambiente até sua entrega nos tecidos. Qualquer interferência em uma ou mais destas etapas irá prejudicar a oxigenação tissular. Em relação a isso, é importante destacar dois conceitos que, embora parecidos, referem-se a diferentes condições:
- Hipoxemia
Refere-se a baixos níveis de oxigênio no sangue arterial. Pode ser causada por problemas de ventilação, troca gasosa nos pulmões, ou perfusão pulmonar inadequada. O oxigênio não está alcançando o sangue, não está se ligando à hemoglobina. É medida diretamente através da gasometria arterial, analisando a pressão parcial de oxigênio (PaO₂) ou indiretamente pela oximetria de pulso (SpO₂) em termos de saturação da hemoglobina.
- Hipóxia:
Refere-se a baixos níveis de oxigênio nos tecidos, insuficientes para manter o metabolismo e garantir o desempenho adequado da função celular. Se prolongada, a hipóxia pode levar à disfunção e morte celular. De acordo com a causa e sua fisiopatologia, a hipóxia pode ser:
-
Hipóxia Hipoxêmica: Causada por hipoxemia, quando há falha nas funções pulmonares de ventilação e/ou oxigenação.
-
Hipóxia Anêmica: Causada por redução na capacidade de transporte de oxigênio pelo sangue, mesmo na presença de função pulmonar normal (ex.: anemia, intoxicação por monóxido de carbono, metahemoglobinemia).
-
Hipóxia Circulatória: Causada por falha na circulação sanguínea, mesmo havendo concentração normal de oxigênio no sangue (ex.: choque, insuficiência cardíaca).
-
Hipóxia Histotóxica: Causada por falha na utilização do oxigênio pelas células, mesmo quando ele chega em concentrações normais nos tecidos. (ex.:envenamento por cianeto).
Avaliação Clínica
Na presença de condições patológicas do sistema respiratório, o paciente poderá apresentar inicialmente sinais de desconforto respiratório e, caso não haja intervenção adequada, o quadro poderá evoluir para franca insuficiência respiratória:
Desconforto respiratório
Refere-se a um estado em que a criança apresenta sinais clínicos de dificuldade para respirar, mas inicialmente ainda consegue manter níveis adequados de oxigênio e dióxido de carbono na circulação sanguínea e nos tecidos. Os sinais de desconforto respiratório incluem aumento da frequência respiratória, retrações intercostais, subcostais e de fúrcula esternal, batimento de aletas nasais, taquicardia, palidez, ansiedade, agitação. O manejo adequado dessa fase é essencial para prevenir a progressão para insuficiência respiratória e parada cardiorrespiratória (PCR).
Insuficiência respiratória
É uma condição mais grave em que o sistema respiratório já não consegue mais manter trocas gasosas adequadas, resultando em hipoxemia, hipercapnia ou ambos. Na insuficiência respiratória, a criança apresenta hipóxia e/ou hipercapnia, taquipneia e taquicardia acentuadas, aumento do esforço respiratório e uso de músculos respiratórios acessórios. No limite, apresenta rebaixamento do nível de consciência, bradipneia, fadiga muscular com redução do esforço respiratório, cianose central, bradicardia, entre outros. Em crianças, a disfunção respiratória pode progredir em um período curto de tempo. Considerando isso, a insuficiência respiratória é, sem dúvida alguma, uma emergência médica e requer intervenções imediatas para prevenir a PCR.
Anamnese
A anamnese, assim que possível (após a abordagem emergencial sistematizada), deve ser abrangente e detalhada, pois muitas causas de insuficiência respiratória em crianças podem não ser evidentes inicialmente. A coleta cuidadosa de informações permite uma avaliação mais precisa da etiologia, da gravidade e de possíveis fatores desencadeantes, orientando, dessa forma, as intervenções terapêuticas adequadas e a decisão sobre a necessidade de exames complementares.
Alguns aspectos da anamnese que merecem destaque:
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Início dos sinais e sintomas (súbito ou progressivo), sua evolução e possíveis fatores desencadeantes.
-
Sinais e sintomas associados, como febre, tosse, estridores, sibilância, dor torácica etc.
-
Período neonatal: prematuridade, necessidade de ventilação mecânica, histórico de broncodisplasia pulmonar ou outras complicações.
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Antecedentes de alergias, doenças respiratórias prévias (asma, bronquiolite, pneumonia, infecções respiratórias frequentes, tuberculose, malformações pulmonares ou de vias aéreas), comorbidades (doenças cardíacas congênitas, imunodeficiências, doenças neuromusculares, refluxo gastroesofágico, doenças metabólicas), internações anteriores.
-
Uso contínuo de medicamentos ou uso atual/recente de medicamentos. Adesão ao tratamento.
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Doenças familiares respiratórias ou alérgicas
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Fatores ambientais relacionados ou contato com outras pessoas doentes.
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Frequência à creche/escola, surtos de infecção respiratória no local.
Exame Físico
O exame físico completo da criança com insuficiência respiratória aguda, permite determinar a gravidade do quadro, identificar a causa subjacente e orientar as intervenções mais apropriadas. Os principais parâmetros a serem avaliados incluem:
- Aspecto Geral e Nível de Consciência
Verificar o estado geral da criança e se há alteração do nível de consciência. Observar sua postura, coloração da pele e mucosas e se há sinais de desconforto respiratório.
- Avaliação da Via Aérea
Observar se há sinais de obstrução das vias aéreas superiores ou inferiores, presença de estridor, sibilos, retrações torácicas, esforço respiratório. Verificar a simetria e a amplitude dos movimentos respiratórios.
- Avaliação da Respiração
Checar a frequência respiratória, observar sinais de esforço respiratório (retrações ou tiragens subcostais, intercostais, supraclaviculares, uso de musculatura respiratória acessória), batimento de asas nasais, movimentos de cabeça acompanhando a respiração. Realizar uma inspeção cuidadosa do tórax, palpação e ausculta para identificar assimetrias, retrações, movimentos paradoxais ou anormalidades auscultatórias. Medir a saturação de oxigênio com um oxímetro de pulso.
- Circulação
Verificar a frequência cardíaca, avaliar o tempo de enchimento capilar, a temperatura das extremidades (frias ou quentes). Palpar os pulsos periféricos e centrais checando amplitude e a regularidade. Aferir a pressão arterial. Observar a cor da pele (palidez, cianose).
- Avaliação Neurológica
Avaliar se há sinais de deterioração neurológica, como rebaixamento do nível de consciência. Observar o tamanho, a simetria e a reatividade das pupilas à luz. Monitorar a presença de movimentos anormais ou alterações no tônus muscular, convulsões. Medir a glicemia capilar.
- Exposição e Exame Físico Completo
Avaliação de toda a pele, procurando observar sinais de infecção (petéquias), trauma, desidratação (turgor da pele, livedo reticular), exantemas ou outras condições. Medir a temperatura corporal.
Classificação
De maneira didática, a insuficiência respiratória aguda pode ser classificada de acordo com seu tempo de evolução, suas causas, a fisiopatologia e a gravidade do quadro.
De acordo com o tempo de evolução:
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Insuficiência Respiratória Aguda: Início súbito ou rápido, persistindo por horas a dias, frequentemente devido a infecções respiratórias agudas, aspiração de corpo estranho, trauma (tórax ou TCE) ou exacerbações de asma.
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Insuficiência Respiratória Crônica: O quadro de insuficiência respiratória persiste ao longo do tempo, geralmente mais de quatro semanas de evolução. Está associada a doenças pulmonares crônicas, como fibrose cística ou displasia broncopulmonar.
De acordo com suas causas:
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Obstrução de vias aéreas superiores: Aspiração de corpo estranho, edema da via aérea (ex.: anafilaxia, laringite), abscessos, hipertrofia de adenoides ou amígdalas, secreções, tumores, anomalias congênitas, rebaixamento do nível de consciência, traumatismos de face ou pescoço.
-
Obstrução de vias aéreas inferiores: Asma, bronquiolite.
-
Doenças do parênquima pulmonar: Pneumonia, edema pulmonar (insuficiência cardíaca congestiva, síndrome do desconforto respiratório agudo), traumatismo torácico com contusão pulmonar, colabamento alveolar (atelectasia).
-
Distúrbios do controle da respiração: Distúrbios neurológicos (meningoencefalites, TCE, tumores intracranianos, convulsões, hidrocefalia, doença neuromuscular), distúrbios metabólicos, intoxicações por medicamentos depressores do SNC.
De acordo com a fisiopatologia:
-
Tipo I (Hipoxêmica): Caracterizada por baixa oxigenação (hipoxemia) e níveis normais ou baixos de dióxido de carbono (CO₂). É o tipo mais comum em pediatria e ocorre em condições como pneumonia, síndrome do desconforto respiratório agudo (SDRA) e outras doenças que afetam a relação ventilação-perfusão.
-
Tipo II (Hipercápnica): Caracterizada por aumento do CO₂ no sangue (hipercapnia) com ou sem hipoxemia. Está associada a condições que afetam a ventilação alveolar, como na asma grave, doença neuromuscular, ou obstruções das vias aéreas superiores.
De acordo com a gravidade:
- Insuficiência Respiratória Leve
-
Taquipneia leve (ainda capaz de falar frases completas).
-
Retrações intercostais discretas e uso mínimo de músculos acessórios
-
Sem cianose
-
Frequência cardíaca normal ou discretamente elevada.
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Nível de consciência preservado
-
Saturação de oxigênio (SpO₂) entre 90% e 94% em ar ambiente.
-
Gasometria arterial: Pressão parcial de oxigênio (PaO₂) entre 60 a 80 mmHg e pressão parcial de dióxido de carbono (PaCO₂) normal ou levemente aumentada.
- Insuficiência Respiratória Moderada
-
Taquipneia moderada (com dificuldade em falar frases completas).
-
Retrações torácicas evidentes e uso moderado de músculos acessórios
-
Cianose central ou periférica intermitente ou leve.
-
Nível de consciência pode estar alterado (irritabilidade, agitação ou letargia leve).
-
Saturação de oxigênio (SpO₂) entre 85% e 89% em ar ambiente.
-
Frequência cardíaca elevada.
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Gasometria arterial: PaO₂ entre 50 a 60 mmHg; PaCO₂ pode estar normal ou levemente aumentada.
- Insuficiência Respiratória Grave
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Taquipneia acentuada ou bradipneia (frequência respiratória muito alta ou diminuída, com incapacidade de falar).
-
Uso acentuado de músculos acessórios, com retrações marcantes (batimento de asas do nariz, tiragem subcostal, intercostal e supraclavicular intensa).
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Cianose central persistente (lábios, língua, pele).
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Nível de consciência alterado (letargia profunda, confusão, coma).
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Saturação de oxigênio (SpO₂) < 85% em ar ambiente.
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Frequência cardíaca muito elevada (taquicardia grave) ou bradicardia.
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Gasometria arterial: PaO₂ < 50 mmHg; PaCO₂ > 45-50 mmHg com acidose respiratória significativa
Diagnóstico etiológico
O diagnóstico etiológico da insuficiência respiratória aguda em crianças envolve a integração de dados clínicos, exames laboratoriais e exames de imagem que permitam identificar a causa subjacente e orientar o tratamento. A escolha dos exames depende da apresentação clínica e da hipótese diagnóstica inicial.
Exames Laboratoriais
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Hemograma: Avaliação de leucocitose, leucopenia, desvio à esquerda (sugestivos de infecção bacteriana), ou eosinofilia (que pode indicar processos alérgicos, asma).
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Gasometria arterial: Importante para avaliar a gravidade da insuficiência respiratória. Indica hipóxia (PaO₂ baixa), hipercapnia (PaCO₂ elevada), acidose respiratória e/ou metabólica (mais detalhes em interpretação da gasometria arterial).
Evolução da PaO₂ e da PaCO₂ de acordo com a progressão da insuficiência respiratória

Tempo e progressão da doença
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Proteína C-reativa (PCR) e Procalcitonina: Marcadores de inflamação que ajudam a diferenciar entre infecções bacterianas e virais.
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Culturas de secreções respiratórias ou hemoculturas: Indicados em casos de suspeita de infecção bacteriana grave (como pneumonia ou sepse).
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Testes rápidos para vírus respiratórios: Podem ser realizados por swab nasal ou nasofaríngeo para detecção de vírus respiratórios comuns (como vírus sincicial respiratório (VSR), influenza, parainfluenza, adenovírus).
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Pesquisa de microrganismos específicos: Pode incluir a pesquisa de micoplasma, clamídia, Bordetella pertussis, tuberculose, dependendo da suspeita clínica.
Exames de Imagem e outros
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Radiografia de tórax: Primeira linha de imagem para avaliação de insuficiência respiratória. Ajuda a identificar: Pneumonia (consolidações, infiltrados intersticiais), atelectasias, pneumotórax, derrame pleural, anomalias estruturais (como hérnia diafragmática).
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Ultrassonografia de tórax: Útil em casos de derrame pleural, para avaliar o volume de líquido, determinar se é um derrame simples ou complicado, e guiar toracocenteses.
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Tomografia Computadorizada de Tórax: Indicada em casos complexos ou quando a radiografia de tórax não é conclusiva. Útil para avaliar lesões pulmonares, abscessos, complicações de pneumonias, doenças intersticiais, e tromboembolismo pulmonar.
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Ecocardiograma: Indicado se houver suspeita de causas cardíacas, como insuficiência cardíaca, cardiopatias congênitas, hipertensão pulmonar ou tamponamento cardíaco.
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Broncoscopia: Indicada em casos de obstrução das vias aéreas, suspeita de corpo estranho, ou em casos complexos de infecção pulmonar não esclarecida.
Manejo da insuficiência respiratória aguda na sala de emergência
Oxigenoterapia
Diante de uma criança com insuficiência respiratória aguda, as primeiras medidas devem ser tomadas de forma rápida e sistematizada para estabilizar a condição do paciente. A abordagem segue o protocolo de assistência à criança gravemente enferma, que prioriza a avaliação e a intervenção sequencial conforme a gravidade do quadro. O paciente deve ser monitorizado e a equipe assistente deve decidir logo sobre a oxigenoterapia e obtenção de acesso venoso.
Abaixo estão as principais etapas em ordem de prioridade, para iniciar a oxigenoterapia:
Via Aérea
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Manutenção da permeabilidade das vias aéreas, verificando se há obstrução parcial ou completa.
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Se houver obstrução, deve-se realizar manobras de abertura da via aérea (como extensão da cabeça e elevação do queixo ou tração da mandíbula, se possível).
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Remoção de secreções ou corpos estranhos, utilizando vácuo-sucção para aspirar secreções em nariz ou boca. Retirar corpos estranhos, se for o caso.
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Estabilização da via aérea em casos mais graves, podendo ser necessário o uso de dispositivos para manter a via aérea pérvia, como a cânula orofaríngea de Guedel ou, em situações extremas, considerar a indicação de intubação orotraqueal.
Respiração
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Em crianças com insuficiência respiratória aguda e com respiração espontânea ativa, recomenda-se a administração de oxigênio suplementar, utilizando o dispositivo mais apropriado para a gravidade do quadro. Dispositivos de baixo fluxo, como cateter nasal ou máscara simples, podem ser utilizados em situações mais leves, enquanto dispositivos de alto fluxo, como máscara não reinalante com reservatório, são indicados para casos moderados a graves.
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Se houver hipoventilação grave, pode ser necessário suporte ventilatório. Nesse caso, deve-se iniciar a ventilação com pressão positiva usando um balão autoinflável com máscara (Ambu) conectado a uma fonte de oxigênio, com fluxo de 10 a 15 litros por minuto, sincronizando cada ventilação com os movimentos inspiratórios da criança.
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Se a insuficiência respiratória persistir, pode ser indicada a ventilação não invasiva (VNI) com CPAP ou BiPAP. Em situações mais críticas, a instalação de uma via aérea avançada (intubação endotraqueal) pode ser necessária.
Principais dispositivos ou interfaces de oxigenoterapia
Cateter ou Cânula Nasal

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Baixo Fluxo de Oxigênio: entre 0,5 e 4 L/min
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FiO₂ máxima 35%
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Indicação: Crianças com insuficiência respiratória leve a moderada. É confortável e permite alimentação oral.
Máscara facial simples
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Moderado Fluxo de Oxigênio: entre 6 e 10 L/min)
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FiO₂ máxima 60%
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Indicação: Crianças com insuficiência respiratória moderada. Oferece uma maior concentração de oxigênio em comparação ao cateter nasal.

Máscara Não Reinalante com Reservatório
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Alto Fluxo de Oxigênio: 10 a 15 L/min
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FiO₂ 95 a 100%
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Indicação: Crianças com insuficiência respiratória moderada a grave, com respiração espontânea ativa, quando são necessárias altas concentrações de oxigênio.

Na sala de emergência, há outros dispositivos para oxigenoterapia de crianças com insuficiência respiratória aguda e respiração espontânea ativa, como por exemplo o sistema de Venturi e o capuz de oxigenoterapia ("Hood"), para neonatos e pequenos lactentes. A escolha do dispositivo depende da gravidade da insuficiência respiratória, idade da criança e de sua capacidade de tolerar o método escolhido. A todo momento a equipe deve reavaliar a evolução do paciente e sua resposta às medidas terapêuticas em curso. Os recursos avançados, tais como VNI ou mesmo intubação endotraqueal, devem ser considerados nos quadros mais graves com evolução clínica e laboratorial desfavoráveis.
Indicações para intubação endotraqueal da criança com insuficiência respiratória aguda na sala de emergência
A intubação endotraqueal em crianças com insuficiência respiratória aguda é uma intervenção crítica, devendo ser realizada com base em uma avaliação cuidadosa de parâmetros clínicos e laboratoriais. A decisão de intubar deve considerar a gravidade da insuficiência respiratória e a falha dos métodos não invasivos de suporte ventilatório.
Os principais parâmetros clínicos a serem considerados, incluem:
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Esforço respiratório muito acentuado, respiração irregular, bradipneia, parada respiratória iminente ou apneia.
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Rebaixamento significativo do nível de consciência, agitação intensa ou convulsão.
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Cianose não corrigida por oxigênio suplementar.
Parâmetros Laboratoriais:
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Gasometria Arterial: PaO₂ < 60 mmHg (em uso de oxigênio suplementar otimizado); PaCO₂ > 50-60 mmHg.
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Acidose respiratória (pH < 7.25) indicando hipoventilação pulmonar significativa.
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Acidose metabólica persistente (pH arterial < 7,2) associada à hipoperfusão e ao comprometimento da oxigenação tecidual.
Além das medidas de suporte de vida que fazem parte do atendimento sistematizado à criança gravemente enferma, a criança com insuficiência respiratória aguda receberá o tratamento específico, de acordo com a causa subjacente.
SAIBA MAIS...
American Heart Association. Suporte Avançado de Vida em Pediatria: Manual do Profissional. Dallas: American Heart Association, 2020.