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TRIAGEM NEONATAL BIOLÓGICA

A Triagem Neonatal Biológica consiste em se detectar precocemente doenças graves antes do aparecimento de seus sinais e sintomas, por meio de coleta de amostras de sangue do recém-nascido em  papel filtro e realização de exame bioquímico para identificação de marcadores biológicos dessas patologias. Atualmente, na rede privada, já é possível realizar a triagem para mais de 100 (cem) condições patológicas diferentes. Na rede pública, o Programa Nacional de Triagem Neonatal do SUS, está em fase de ampliação de seus exames. A meta é chegar, nos próximos anos, à triagem de 33 doenças. No Estado de Minas Gerais, por exemplo, desde 2021 o teste do pezinho foi ampliado de seis para doze doenças.

PKU

Fenilcetonúria

Características da doença

A Fenilcetonúria é um erro inato do metabolismo de caráter hereditário autossômico recessivo, causada pela alteração do gene responsável pela síntese da enzima fenilalanina-hidroxilase. Essa enzima é responsável pela hidroxilação do aminoácido fenilalanina levando à formação do aminoácido tirosina. Sua deficiência produz, portanto, um acúmulo de fenilalanina no sangue.

De acordo com o percentual de atividade enzimática, são conhecidas três formas:

  • Fenilcetonúria Clássica: atividade da enzima fenilalanina hidroxilase menor que 1% e níveis de fenilalanina plasmática superiores a 20 mg/dL;

  • Fenilcetonúria Leve: atividade enzimática entre 1% e 3 e níveis plasmáticos de fenilalanina entre 10 mg/dL e 20 mg/dL;

  • Hiperfenilalaninemia: atividade enzimática superior a 3% e níveis de fenilalanina entre 4 mg/dL e 10 mg/Dl. Esta forma é considerada uma condição benigna sem manifestação clínica e não necessita tratamento.

A Fenilcetonúria se caracteriza por atraso global do desenvolvimento neuropsicomotor, deficiência intelectual, agitação psicomotora, convulsões, alterações eletroencefalográficas e odor característico na urina.

Diagnóstico e Tratamento

O diagnóstico da Fenilcetonúria é feito pela dosagem de fenilalanina cujo resultado seja superior a 10 mg/dL em pelo menos duas amostras laboratoriais distintas. Também pode ser feito o diagnóstico molecular para a identificação da mutação causadora do defeito genético. O diagnóstico precoce e o início do tratamento antes dos 3 meses de vida é fundamental para que a criança não apresente o quadro clínico da doença.

O tratamento deverá ser mantido por toda a vida e consiste basicamente em uma dieta com baixo teor de fenilalanina (não isenta de fenilalanina), devendo-se manter os níveis plasmáticos adequados desse aminoácido para permitir o crescimento e desenvolvimento normais do indivíduo. Uma dieta totalmente isenta de fenilalanina causaria um quadro ainda mais grave que a Fenilcetonúria. A dieta deve ser hipoproteica, complementada por uma fórmula de aminoácidos isenta de fenilalanina. A dieta deve conter entre 250 mg e 500 mg de fenilalanina por dia (cerca de dez vezes menos que a dieta habitual de um indivíduo não fenilcetonúrico.

https://docs.bvsalud.org/biblioref/2018/01/877193/154282-288.pdf

https://www.gov.br/conitec/pt-br/midias/protocolos/resumidos/pcdt_resumido_fenilcetonuria.pdf

hipotireoidismo

Hipotireoidismo congênito

Características da doença

 

O Hipotireoidismo Congênito é uma condição patológica em que a glândula tireoide do recém‑nascido apresenta incapacidade em secretar hormônios tireoidianos (tiroxina e triiodotironina) em quantidades adequadas, resultando em redução sistêmica do metabolismo celular. Esses hormônios são fundamentais para que haja maturação adequada do sistema nervoso central. Dessa forma, estabelecer o diagnóstico no período neonatal e iniciar o tratamento imediatamente é fundamental para prevenir graves sequelas neurológicas.

 

A doença pode ser classificada em:

  • Primária: quando a alteração ocorre na glândula tireoide

  • Secundária: quando a alteração ocorre na hipófise (raro)

  • Terciária: quando a alteração ocorre no hipotálamo (raro)

 

Etiologia do hipotireoidismo congênito primário:

  • Disgenesia tireoidiana (85% dos casos)

  • Disormoniogênese (erro inato do metabolismo):  defeitos na síntese dos hormônios tireoidianos devido a mutações genéticas recessivas (15% dos casos)

 

Crianças não diagnosticadas no período neonatal e, consequentemente, não tratadas precocemente, terão o crescimento e o desenvolvimento neurológico seriamente comprometidos. O quadro clínico inclui: choro rouco, problemas respiratórios, cianose, anemia, icterícia prolongada, hiporexia, constipação, hérnia umbilical, sopro cardíaco, bradicardia, pele seca e sem elasticidade, livedo reticularis, mixedema, alargamento de fontanelas, crescimento pôndero‑estatural, atraso na dentição, retardo na maturação óssea, hipotonia muscular, sonolência excessiva, atraso de desenvolvimento neuropsicomotor e deficiência intelectual.

 

Diagnóstico e Tratamento

O momento ideal para o diagnóstico do Hipotireoidismo Congênito é, sem dúvida, o período neonatal, pois é sabido que a partir da segunda semana de vida a deficiência de hormônios tireóideos poderá causar alguma lesão neurológica. Após o resultado positivo inicial no Programa de Triagem Neonatal, deve ser realizada a dosagem do T4 (total e livre) e do TSH em amostra de sangue venoso, para que haja a efetiva confirmação diagnóstica.

 

Para que a etiologia seja estabelecida, é indicada a realização de exames de ultrassonografia ou cintilografia com captação tireóidea de iodo radioativo, pois, na maioria das vezes, a origem do problema está na própria glândula tireoide.

O tratamento da doença consiste na reposição de levotiroxina. O acompanhamento deve incluir exame clínico periódico, avaliação do crescimento e desenvolvimento neuropsicomotor além do monitoramento laboratorial de T4 e TSH.                             

D Falciforme

Doença
Falciforme

Características da doença

 

A Doença Falciforme é uma doença genética de herança autossômica recessiva, causada pela troca de um aminoácido na cadeia beta da molécula de hemoglobina. A hemoglobina mutante, denominada ‘hemoglobina S’ pode sofrer polimerização quando exposta a determinadas condições, como febre, hipóxia, acidose, infecções, frio, desidratação, provocando deformação das hemácias, que passam a apresentar a forma de foice ou meia-lua. Sob as condições citadas, as hemácias deformadas, que também são menos flexíveis, podem se impactar na microcirculação causando vaso oclusão e consequente isquemia tecidual. Essas hemácias são mais susceptíveis à hemólise e consequentemente, apresentam vida média mais curta. Assim, a doença falciforme é uma condição patológica caracterizada por fenômenos vasoclusivos recorrentes e anemia hemolítica crônica. 

A Doença Falciforme inclui todas as hemoglobinopatias em que pelo menos uma das hemoglobinas mutantes é a Hb S. As apresentações mais frequentes são:

  • Anemia Falciforme (forma homozigótica SS: somente Hemoglobinas S)

  • Hemoglobinas S associada à hemoglobina da beta-talassemia 

  • Hemoglobinas S associada à hemoglobina C

  • Hemoglobinas S associada à hemoglobina D

 

A anemia hemolítica associada aos fenômenos vaso oclusivos recorrentes, levam à isquemia e hipóxia crônicas ocasionando lesão tecidual e orgânica progressiva. Frequentemente a dactilite em mãos e pés, caracterizada por dor e edema nas extremidades distais dos membros, são as primeiras manifestações.  Mais raramente, a sepse pneumocócica pode ser a primeira manifestação. O pico de morbimortalidade situa-se ao redor de 2 a 3 anos de vida, sendo que as principais causas de óbito são o choque séptico e o sequestro esplênico. Entre as manifestações clínicas estão as crises álgicas, infecções por germes capsulados, sequestro esplênico, síndrome torácica aguda, crise medular aplásica, acidente vascular encefálico, insuficiência renal progressiva, cardiomegalia, entre outras alterações. 

 

Diagnóstico e Tratamento

O diagnóstico da doença falciforme pela triagem neonatal biológica permite o início precoce de cuidados preventivos.

  • (Hb AA): Padrão normal de hemoglobina: Em todo recém-nascido predomina a hemoglobina fetal (Hb F) em proporção superior à hemoglobina A (Hb A). Assim, o resultado normal no teste do pezinho é Hb FA 

  • (Hb AS): Traço falciforme:  para essa condição, o resultado no teste do pezinho é Hb FAS 

  • (Hb SS): Anemia falciforme; nesse caso, o resultado no teste do pezinho é Hb FS 

  • (Hb Tal): Dupla heterozigose entre a Hb S e a Hb beta-talassemia; nesse caso, o resultado no teste do pezinho é Hb FSA 

  • (Hb SC): Dupla heterozigose entre a Hb S e a Hb C; nesse caso, o resultado no teste do pezinho é Hb FSC

  • (Hb SD): Dupla heterozigose entre Hb S e Hb D; nesse caso, o resultado no teste do pezinho é Hb FSD

 

A confirmação diagnóstica se faz com a eletroforese de hemoglobina. Com o diagnóstico precoce e adesão ao tratamento é possível garantir uma melhor expectativa e qualidade de vida, além de reduzir a morbimortalidade pela doença.

Os pacientes falcêmicos devem ter acompanhamento clínico periódico especializado e receber:

  • suplementação diária de ácido fólico (de 1 a 5 mg/dia)

  • antibioticoterapia profilática com penicilina, dos quatro meses até o cinco anos de idade

  • esquema vacinal especial incluindo cobertura adicional com vacinas contra o streptococcus pneumoniae  

  • para casos que contemplem critérios específicos, pode haver indicação de hidroxiureia e/ou de eritropoietina.

O tratamento das crises falcêmicas depende do tipo de crise. São medicamentos analgésicos comuns ou opióides, anti-inflamatórios não esteroidais, antibióticos, hidratação, oxigênio e em alguns casos pode haver indicação de transfusão sanguínea.

 

De acordo com critérios específicos, pode haver indicação médica para  transplante de medula óssea, sendo essa a possiblidade de cura definitiva para a doença.

Fibrose cistica

Fibrose
Cística

Características da doença

A fibrose cística é uma doença genética com padrão de herança autossômica recessiva, caracterizada pela alteração do gene CFTR, responsável por codificar uma proteína (também chamada CFTR) que desempenha um importante papel no transporte de íons cloro através das membranas celulares. Essa proteína atua na regulação da hidratação e viscosidade do muco e secreções celulares, bem como no controle do equilíbrio iônico e na função das células epiteliais. Existem mais de 2.000 mutações conhecidas desse gene, associadas à fibrose cística. Essas mutações variam em sua frequência na população e também variam em termos de gravidade clínica. A mutação mais frequente é a ΔF508, responsável por cerca de 70% a 90% dos casos. As consequências dessas mutações variam desde a formação de uma proteína CFTR anômala disfuncional, até mesmo uma ausência completa dessa proteína. Os órgãos e estruturas mais afetadas na doença são os pulmões, pâncreas, fígado, intestino e glândulas sudoríparas. Há um acúmulo de muco e secreções espessas e viscosas nesses órgãos, causando problemas respiratórios, digestivos, nutricionais, infecciosos entre outras complicações. Caracteristicamente, as glândulas sudoríparas produzem suor mais salgado do que o normal.

As manifestações clínicas, gravidade e progressão da doença variam em relação ao tipo de mutação da doença e ainda de indivíduo para indivíduo com o mesmo tipo de mutação:

  • Problemas respiratórios: tosse crônica, produção excessiva de muco espesso e viscoso, infecções pulmonares recorrentes, lesões permanentes no parênquima pulmonar ocasionando perda progressiva da função pulmonar, taquipneia, esforço respiratório e hipoxemia. 

  • Insuficiência pancreática: graus variados de insuficiência pancreática com produção insuficiente de enzimas digestivas levando à má absorção de nutrientes, principalmente gorduras e proteínas, resultando em esteatorreia, deficiências nutricionais e déficit ponderal. 

  • Outros problemas gastrointestinais: incluem obstrução intestinal devido à formação de muco espesso, refluxo gastroesofágico, constipação, presença de pólipos no intestino e obstrução de ductos biliares.

  • Outras manifestações: diabetes mellitus, osteoporose e osteopenia, atraso no desenvolvimento puberal, infertilidade, sinusite crônica. 

  

Diagnóstico e Tratamento

O exame realizado na triagem neonatal para fibrose cística baseia-se na dosagem da tripsina imunorreativa. Após duas dosagens positivas realizadas nos primeiros 30 dias de vida, faz-se o teste do suor. A dosagem de cloro no suor acima de 60 mmol/l, em duas amostras, confirma o diagnóstico.

 

O tratamento iniciado precocemente, pode melhorar a qualidade de vida e ampliar a sobrevida dos pacientes com fibrose cística. O manejo deve ser multiprofissional e inclui acompanhamento médico regular, fisioterapia respiratória, terapia nutricional, microbiologista, apoio psicológico, entre outros. 
 

Em sua rotina de acompanhamento, além do exame clínico, esses pacientes realizam periodicamente exames de imagem pulmonar, monitoramento da prova de função pulmonar a partir de cinco anos de idade, recebem suplementação oral diária de cloreto de sódio, reposição de enzimas pancreáticas e suplementação vitamínica (vitaminas A, D, E, K). 


Coletas periódicas de amostras de secreções respiratórias são essenciais para o monitoramento da colonização/infecção bacteriana crônica das vias aéreas. Os agentes mais frequentemente encontrados são Staphilococcus aureus, Pseudomonas aeruginosa e Stenotrophomonas maltophilia, complexo Burkholderia cepacia. Na presença de complicações infecciosas, é indicada a antibioticoterapia de amplo espectro, direcionada pelas culturas mais recentes. 


O tratamento diário da doença pulmonar na fibrose cística inclui nebulizações com diversos medicamentos: broncodilatadores, solução salina hipertônica, alfa-dornase, tobramicina, colistina, conforme protocolo do serviço. A oxigenoterapia está indicada para os pacientes com função pulmonar comprometida e hipoxemia. 


Os pacientes que se enquadrem em critérios específicos poderão participar do programa de  transplante pulmonar.

Hiperplasia Adrenal
Congênita

Características da doença

O termo “hiperplasia adrenal congênita” se refere à variadas síndromes de herança autossômica recessiva resultantes de diferentes deficiências enzimáticas na síntese de esteroides nas glândulas adrenais. A deficiência mais comum se refere à enzima 21-hidroxilase, que responde por cerca de 95% dos casos de hiperplasia adrenal congênita. As manifestações clínicas da deficiência da 21-hidroxilase estão correlacionadas com o grau de deficiência enzimática. Os sinais e sintomas podem ser decorrentes da deficiência de glicocorticoide, associada ou não à deficiência de mineralocorticoide, e do excesso de andrógenos nos períodos pré e pós-natal. As formas clínicas da deficiência de 21-hidroxilase são divididas em dois grupos: Forma clássica, com manifestações ao nascimento (subdividida em Forma perdedora de sal e Forma virilizante simples) e Forma não clássica, cujos sintomas se iniciam tardiamente na infância ou na puberdade ou mesmo no adulto. O quadro não clássico além de tardio, apresenta intensidade e complicações muito menos graves que a forma clássica.

Enzima envolvida

Incidência

Formas Clínicas

Alterações hormonais

21-Hidroxilase

17α-hidroxilase

11β-hidroxilase

95%

5%

Forma Clássica

Forma Não Clássica

Forma Virilizante Simples

Forma Perdedora de Sal

Hiperandrogenismo no período pré e pós-natal + Deficiência de glicocorticoide

Deficiência de mineralocorticoide + Hiperandrogenismo no período pré e pós-natal + Deficiência de glicocorticoide

Manifestação tardia na infância, puberdade ou adulto

Formas mais raras

Manifestação precoce

no período neonatal

Forma clássica virilizante simples

Recém-nascidos do sexo feminino apresentam ao nascer quadro de virilização da genitália externa, desde clitoromegalia isolada até a aparência semelhante à de uma genitália masculina, porém sem a presença de gônadas palpáveis. Nos recém-nascidos do sexo masculino, os sinais clínicos são ausentes ou pouco evidentes e o quadro pode passar inicialmente despercebido. Quando não diagnosticada e tratada adequadamente, essa forma clínica pode manter o processo de virilização genital progressivo em ambos os sexos, com aumento progressivo do clitóris ou pênis, pubarca precoce, hipertrofia muscular, acne e alteração da voz que se torna mais grave. Evolui também com aceleração da velocidade de crescimento com avanço da idade óssea e fechamento epifisário precoce, resultando em baixa estatura final.

 

Forma clássica perdedora de sal

A forma clássica perdedora de sal, corresponde a 70-75% das formas clássicas e se caracteriza pelo comprometimento na síntese de mineralocorticoide (aldosterona) além do quadro de virilização da genitália externa que também ocorre, de modo semelhante à forma clássica virilizante simples. A deficiência de aldosterona resulta em perda ponderal, desidratação hiponatrêmica e hipercalêmica, com potencial evolução para choque hipovolêmico e óbito, se o diagnóstico não for precoce. Esse quadro ocorre em geral na segunda semana de vida.
 

Diagnóstico e Tratamento

A triagem neonatal garante o diagnóstico precoce da doença permitindo a prevenção ou amenização da crise perdedora de sal e suas complicações a longo prazo. O diagnóstico neonatal possibilita também o correto registro do sexo social em meninas com virilização genital e o início oportuno de terapia de reposição hormonal evitando assim a pseudo-puberdade precoce e a baixa estatura em ambos os sexos. 

A dosagem da 17-hidroxiprogesterona é o exame realizado nos programas de triagem neonatal e foca na investigação das formas clássicas da hiperplasia adrenal congênita. A triagem neonatal garante o diagnóstico precoce da doença permitindo a prevenção ou amenização da crise perdedora de sal e suas complicações a longo prazo. O diagnóstico neonatal possibilita também o correto registro do sexo social em meninas com virilização genital e o início oportuno de terapia de reposição hormonal evitando assim a pseudo-puberdade precoce e a baixa estatura em ambos os sexos.

 

O resultado da 17-hidroxiprogesterona no teste de triagem neonatal deve levar em consideração o peso ao nascimento e a idade da coleta. Foram estabelecidos percentis de corte, para garantir melhor sensibilidade e adequada especificidade do exame. Valores abaixo do percentil de corte são considerados normais. Os resultados com valores maiores que o dobro do percentil de corte, serão convocados imediatamente para avaliação médica e realização de exames séricos confirmatórios com urgência, a fim de evitar ou minimizar a crise de perda de sal.  Se os resultados apresentarem valores acima do percentil de corte, porém menores que seu dobro, o teste de triagem em papel-filtro deverá ser repetido. Os recém-nascidos, com resultados positivos serão encaminhados para a consulta médica.

Valores de referência (percentis de corte)

Peso de Nascimento    17-OHP (3º-5º dia)               

< 1500 g                                 110 ng/mL

1500 - 1999 g                          43 ng/mL 

2000 - 2499 g                          28 ng/mL

> 2500 g                                   15 ng/mL

                                                         

Todos os neonatos cujos valores da primeira amostra em papel de filtro forem maiores que o dobro do percentil de corte e aqueles que tiveram resultados da segunda amostra em papel de filtro também alterados, serão convocados com urgência para coleta de testes confirmatórios, que consistem em dosagens séricas de 17-hidroxiprogesterona, cortisol, androstenediona, testosterona, sódio, potássio. 

 

Os objetivos principais do tratamento da hiperplasia adrenal congênita por deficiência da 21-hidroxilase são:

  • suprir as deficiências de glicocorticoide e mineralocorticoide

  • prevenir a crise de insuficiência adrenal

  • reduzir a hipersecreção adrenocortical dos esteroides androgênicos

  • promover crescimento e puberdade adequados com preservação do potencial de altura final

 

Todos os pacientes deverão receber glicocorticoides de meia-vida curta por via oral em doses baixas. Os portadores da forma clássica perdedora de sal receberão, além da reposição de glicocorticoide, a reposição de mineralocorticoide e suplementação de cloreto de sódio.

Deficiênca biotinidase

Deficiência de
Biotinidase

Características da doença

A enzima biotinidase desempenha um papel importante no metabolismo da biotina, uma vitamina do complexo B, indispensável para importantes processos metabólicos no organismo. A biotinidase é responsável por liberar a biotina das proteínas alimentares e de outras moléculas ingeridas e torná-la biologicamente ativa, permitindo, assim, que ela exerça adequadamente suas funções.

 

A deficiência de biotinidase é causada por um defeito genético com padrão de herança autossômica recessiva em que a enzima biotinidase não é produzida em quantidade suficiente ou é produzida com sua atividade reduzida. Trata-se, portanto, de um erro inato do metabolismo em que o indivíduo tem dificuldade em processar e utilizar a biotina dos alimentos que compõem sua dieta, causando, como consequência, uma depleção endógena dessa vitamina.

 

Classificação: 

  • Deficiência profunda de biotinidase: atividade enzimática menor que 10% *

  • Deficiência parcial de biotinidase: atividade enzimática entre 10% e 30% *

  • Sem deficiência de biotinidase: atividade enzimática acima de 30% *

       * considerando o limite inferior de referência para indivíduos não portadores de deficiência de biotinidase.

Em geral, a partir da sétima semana de vida, as manifestações clínicas têm início: crises epiléticas, hipotonia, redução do crescimento encefálico, atraso do desenvolvimento neuropsicomotor, alopecia e dermatite eczematoide. Se o diagnóstico não for realizado, o quadro evolui com distúrbios visuais, auditivos, assim como atraso no desenvolvimento da linguagem. 

Diagnóstico e Tratamento

O diagnóstico passa pela triagem neonatal (exame qualitativo com resultado “normal” ou “alterado”) e um teste confirmatório (exame quantitativo que estabelece a concentração ou o percentual de atividade da enzima biotinidase).   

O tratamento medicamentoso é muito simples, de baixo custo e consiste na utilização de biotina em doses diárias, de acordo com a classificação da deficiência de biotina, baseada no teste confirmatório quantitativo. 
Crianças com deficiência parcial de biotinidase: 5 a 10 mg/dia; 
Crianças com deficiência profunda de biotinidase: 10 a 20 mg/dia. 
 

toxo congenita

Toxoplasmose Congênita

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O Governo Federal incorporou o exame para toxoplasmose congênita como primeira etapa do programa de ampliação do Teste do Pezinho. A inclusão da toxoplasmose no teste de pezinho vem complementar à triagem materna no pré-natal, que já é feita de rotina há vários anos. A toxoplasmose congênita resulta da transferência transplacentária do Toxoplasma gondii para o feto, decorrente de infecção primária da mãe durante a gestação. Trata-se de uma doença potencialmente grave em que os recém-nascidos podem apresentar manifestações clínicas no período neonatal ou nos primeiros meses de vida, com grande risco de sequelas neurossensoriais incapacitantes. Considerando a alta prevalência de toxoplasmose no Brasil, uma parcela significativa de mulheres em idade fértil (50-80%) são IgG positivas e 20-50% são suscetíveis (IgG e IgM negativas), estando em risco de adquirir a infecção na gestação. A incidência de nascimentos de crianças infectadas varia de 5 a 23 crianças a cada 10.000 nascidos vivos. A detecção de IgM no período neonatal pelo teste do pezinho diagnostica a toxoplasmose congênita em mais de 80% dos casos e o tratamento precoce pode reduzir os danos causados pela doença.

 

Características da doença

A toxoplasmose é causada pelo protozoário Toxoplasma gondii que tem como hospedeiros intermediários: humanos, pássaros, roedores, entre outros e os hospedeiros definitivos são os felinos. Os oocistos produzidos exclusivamente no intestino delgado dos felinos, são liberados em suas fezes contaminando os recursos hídricos e o solo. O ser humano e outros animais se contaminam principalmente pela ingestão de cistos presentes em carnes cruas ou mal cozidas ou ingestão de oocistos presentes em fezes de felinos que contaminam alimentos e água. 

 

Quando a infecção foi adquirida vários meses antes da gravidez (não se sabe o número exato de meses ao certo) não há transmissão materno-fetal do parasita. Quando a infecção ocorre no início da gravidez (ou alguns meses antes), o risco de transmissão varia de zero a dois pontos percentuais. A transmissão do T. gondii da mãe para o feto se dá por via transplacentária (transmissão vertical). No feto, o parasita causa lesões de diferentes graus de gravidade, dependendo da carga e virulência do parasita, da imunidade materna e da idade gestacional. Embora no primeiro trimestre de gestação, o risco transmissão ao feto do seja menor, caso ela ocorra  o feto poderá ter formas mais graves da doença. Após esse período, o risco de transmissão vai se acentuando (chegando a 80% nas semanas finais da gravidez) embora, quanto mais tarde ela ocorrer, menor será o risco de manifestações graves da doença na criança.

 

Considerando a gravidade, a toxoplasmose congênita pode se apresentar de quatro formas:

(1) Doença grave neonatal

(2) Doença (grave ou leve) ocorrendo nos primeiros meses de vida

(3) Sequela ou reativação durante a infância ou a adolescência, de uma infecção previamente não diagnosticada

(4) Infecção subclínica

As apresentações da doença no feto e recém-nascido variam amplamente, desde a completa ausência de sinais clínicos até o óbito.  Muitas crianças infectadas apresentam-se aparentemente normais ao nascimento, porque os sinais e sintomas não foram diagnosticados ao nascimento ou só irão se manifestar semanas, meses ou anos mais tarde. As manifestações clínicas na criança incluem encefalite, convulsões, microcefalia ou macrocefalia, hidrocefalia, hipotonia, paralisia, calcificações intracranianas, deficiência psicomotora ou intelectual, coriorretinite, deficiência visual e auditiva (potencialmente levando à cegueira e surdez), hepatoesplenomegalia, icterícia. 

Diagnóstico e Tratamento

Levando-se em conta que tanto as gestantes quanto os recém-nascidos infectados podem ser assintomáticos, os exames laboratoriais são imprescindíveis para o diagnóstico.  Os testes sorológicos específicos durante a infecção (detecção sérica de anticorpos IgG, IgM, IgA ou IgE contra o T. gondii) podem, não apenas estabelecer o diagnóstico com também identificar o período da infecção, se recente (fase aguda), ou antiga (fase de latência ou crônica). O diagnóstico sorológico no bebê é dificultado pela presença de anticorpos de classe IgG maternos transferidos por via transplacentária durante a gestação cujos títulos são bastante semelhantes aos títulos maternos. Já os anticorpos de classe IgM são indicativos de toxoplasmose congênita quando encontrados no neonato, pois eles não atravessam a barreira placentária. O chamado teste de avidez de anticorpos IgG é importante para determinar o momento da infecção materna e distinguir entre infecções recentes e antigas. Saber se a contaminação ocorreu antes ou durante a gestação tem importância para se estimar o risco de transmissão da doença para o feto. A avidez de anticorpos IgG baixa indica uma infecção recente e avidez alta indica que a contaminação ocorreu há mais de três a quatro meses antes da realização do exame.

As gestantes que apresentarem suspeita de infecção por T. gondii adquirida durante a gestação devem iniciar imediatamente o tratamento, o qual varia de acordo com a idade gestacional em que ela se encontre:

  • Diagnóstico feito nas primeiras 16 semanas de gestação: A medicação a ser prescrita é a espiramicina que, embora não atravesse a barreira placentária, tem o efeito de impedir ou retardar a passagem do Toxoplasma gondii para o feto.

  • A partir da 16ª semana: A espiramicina é substituída pelo tratamento tríplice materno: sulfadiazina, pirimetamina e ácido folínico. Esse esquema é contraindicado antes disso devido à sua toxicidade sobre o feto.

beta oxidação

Distúrbios da Beta Oxidação de Ácidos Graxos

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Embora a glicose seja a principal fonte de energia das células, quando ela se torna ausente ou escassa, os lipídios (ácidos graxos) são utilizados como fonte alternativa na produção energética celular de um modo geral.  Além disso, particularmente nos músculos esqueléticos e cardíaco, o metabolismo dos lipídios é a principal via metabólica energética. 
 

A beta oxidação é justamente o processo metabólico enzimático pelo qual os ácidos graxos são degradados e utilizados na produção celular de energia. Os distúrbios relacionados a esse processo constituem um grupo de doenças de caráter genético hereditário causadas pela ausência ou defeito de alguma dessas enzimas. São condições graves, cujo prognóstico melhora muito quando o diagnóstico é feito precocemente, ainda no período neonatal, permitindo o seu tratamento em tempo oportuno e prevenção de suas complicações. 
 

Portanto sua inclusão no teste do pezinho veio permitir o acesso ao diagnóstico precoce, de modo universal para toda a população, antes mesmo de se iniciarem as primeiras manifestações clínicas.

 

Características das doenças

Os distúrbios que são parte do programa de triagem neonatal biológica (teste do pezinho), incluem: 

  • A deficiência de acil-CoA desidrogenase de cadeia média é o erro inato mais frequente na beta oxidação. Se deve a uma incapacidade de metabolizar completamente essas moléculas, levando ao seu acúmulo e produção inadequada de energia. Pode causar episódios de hipoglicemia, letargia, vômitos e em casos graves, coma. 

 

  • Na deficiência de acil-CoA desidrogenase de cadeia longa, a capacidade de metabolizar ácidos graxos de cadeia longa é afetada. Os sintomas podem variar de episódios de hipoglicemia, fraqueza muscular, problemas hepáticos e cardíacos.

 

  • Na deficiência de acil-CoA desidrogenase de cadeia muito longa, ocorre acúmulo de ácidos graxos de cadeia muito longa e diminuição da produção de energia. Os sintomas podem incluir hipoglicemia, fraqueza muscular, problemas hepáticos, cardiomiopatia e distúrbios neurológicos.

 

  • A deficiência da proteína trifuncional é uma desordem que afeta enzimas envolvidas em várias etapas da beta oxidação. Os sintomas incluem episódios de hipoglicemia, cardiomiopatia, problemas hepáticos e musculares.

 

  • Deficiência primária de carnitina: a carnitina é uma molécula imprescindível no transporte dos ácidos graxos para o interior da mitocôndria, onde ocorre a beta oxidação dos ácidos graxos. Assim, sua deficiência faz com que os ácidos graxos acumulem no citoplasma e não passem pela beta oxidação mitocondrial. Os sintomas podem incluir fraqueza muscular, hipoglicemia, fadiga, hepatomegalia e cardiomiopatia.

Muitos distúrbios da beta oxidação podem se manifestar com sintomas como hipoglicemia, letargia, vômitos, desidratação, convulsões e distúrbios do desenvolvimento. Outras manifestações podem incluir problemas hepáticos, musculares e cardíacos. As crianças que apresentem esses sinais e sintomas deverão passar por avaliação clínica detalhada, exames laboratoriais bioquímicos além de testes genéticos. 

Tratamento

Cada distúrbio da beta oxidação requer um plano de tratamento individualizado e acompanhamento médico e multiprofissional especializado é essencial para garantir a melhor qualidade de vida possível para os pacientes afetados.

 

De um modo geral, o tratamento deve incluir um plano alimentar adequado e monitoramento regular dos níveis de nutrientes do organismo: Dieta específica com fontes alternativas de energia, tais como, carboidratos de cadeia curta, alimentação com intervalos mais curtos (evitando-se períodos prolongados de jejum), uso de suplementos específicos, como triglicerídeos de cadeia média e carnitina.  

Os pacientes com distúrbios da beta oxidação estão sujeitos a crises metabólicas desencadeadas por jejum prolongado, doenças ou estresse. Nesse caso, é necessário que haja atendimento de urgência para administração de hidratação intravenosa, glicose e outras medidas de suporte.

Os distúrbios da beta oxidação são condições genéticas, e aconselhamento genético é importante para fornecer informações sobre riscos, planejamento familiar e testes genéticos para membros da família. O acompanhamento regular com médicos e multiprofissionais especialistas em metabolismo é fundamental para monitorar a progressão da doença, ajustar o tratamento, prevenir complicações e fornecer suporte contínuo ao paciente e à família.

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